Rever esta bela e complexa realidade do Piemonte está sendo para mim uma intensa experiência espiritual. Diria até um retiro anual. Trata-se de uma circunstância especial para mim. Com 28 anos de profissão religiosa e 21 de padre, era hora de refletir um pouco mais para poder servir ainda melhor, sobretudo neste campo da salesianidade.
Esses dias no Colle Dom Bosco e Chieri foram mágicos, cheios de novas descobertas sempre na busca de compreender mais e melhor a vontade de Deus. Os ambientes salesianos que tive a oportunidade de conhecer melhor encheram meu coração de esperança e coragem. Percorrer a região de Murialdo, Capriglio, Butigliera, rezar nos Becchi e andar livremente pelo templo Dom Bosco, parar diante da relíquia de Dom Bosco, no lugar onde ele nasceu, deixaram em mim a marca da renovação do dom que recebi no carisma salesiano.
Em Chieri iniciamos num lugar novo chamado Croce de Pane, segundo pesquisa do Centro de Quito, ali os Boscos começaram sua migração. Era um convento dos padres Barnabitas e os Boscos eram trabalhadores daquela fazenda. É uma historia que recorre às origens de Dom Bosco e emociona. O contato com a casa onde nasceu Domingos Sávio e, sobretudo onde ele morreu, calou profundamente dentro de mim. Fiquei ali parado e rezando durante algum tempo. Rezei pela inspetoria.
Retornando a Chieri tivemos a oportunidade de ver todos os lugares por onde o jovem Bosco passou e fez história naquela cidade. Um João Bosco dinâmico, alegre, trabalhador, lutador, cheio de iniciativas e desejoso de ser padre. O grande seminário de São Filipe, com sua capela majestosa e o tumulo de Comollo me levaram a refletir sobre aquele Bosco seminarista tecendo relações, aprofundando a filosofia e a teologia, com saudades certamente do tempo livre que tinha na cidade e as amizades, porém, um Bosco centrado no seu projeto de vida.
Em seguida veio Turim. Uma cidade grande já naquele tempo. Cheia de atrativos e que acolheu o jovem padre Bosco. Suas igrejas, capelas e palácios falam de uma mudança epocal que impactou Dom Bosco e o levou a fazer uma opção radical pelos jovens mais pobres. Três situações me impressionaram em Turim: a primeira a capela da Imaculada onde Dom Bosco foi ordenado. Simples, sóbria, mas elegante. Imaginar que Dom Bosco ali sendo ordenado foi uma emoção muito grande. A segunda foi a visita a igreja da visitação, construída por Santa Francisca de Chantal. Uma joia. Mais ainda sentar na capela onde ficou Dom Bosco durante o retiro para a ordenação. Ali percebi o quanto a CRUZ tem sentido na nossa espiritualidade. Cruz que significa sacrifício – ressurreição, doação total: DA MIHI ANIMAS. A terceira foi a sacristia da igreja de São Francisco de Assis e o apertado pátio onde tudo começou. A sacristia é maior do que o pátio. Nossa ação junto aos jovens não precisa de tantos espaços, mas de uma ação focada. Isto Dom Bosco nos ensina.
Um dado que chamou a minha atenção em Turim é a concentração de santos e santas que permearam a vida de Dom Bosco e sua espiritualidade. Causa impressão tantos santos num espaço de tempo tão curto e todos voltados à evangelização dos mais pobres, naquela ocasião, os presos, os filhos de presos, as prostitutas, os doentes, os jovens perdidos na grande cidade. Eram fronteiras que foram vencidas.
Algumas questões brotaram no meu coração e partilho com os irmãos:
1. Saber retornar a Dom Bosco é valorizar as fontes do nosso carisma. Não se trata apenas de uma questão intelectual, mas sentimento, coração e vontade.
2. Voltar a Dom Bosco significa também distanciar-se de preconceitos que a busca de um melhor entendimento dos fatos e das pessoas podem ocasionalmente suscitar.
3. Voltar a Dom Bosco supõe o esforço de conhecer os vários rostos de pessoas com as quais ele criou amizade e somaram com ele no projeto de salvação dos jovens. É, ainda, descobrir a dimensão contemplativa de Dom Bosco, porque somos levados a vê-lo como o ativista, mas pouco como o orante.
4. Voltar a Dom Bosco é também despojar-se continuamente de certezas que muitas vezes não são tão importantes.