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Um povo cada vez menor

Não é novidade para ninguém que estamos diminuindo como comunidade católica. É uma sangria anual cada vez mais evidente. Os motivos são muitos, desde a concepção atual de que é possível viver uma crença isoladamente, sem regras e ritos convencionais; até a idéia de que Deus é possível, mas a Instituição, seja ela qual for, impede a realização plena da pessoa.

Um grande teólogo do século XX já profetizara esta realidade nos anos 60. Naquela ocasião a profecia não produziu os efeitos necessários, era um momento de forte transição religiosa e abertura da Igreja católica para os novos tempos. Hoje, contudo, não podemos passar ao largo deste fato. A profecia do grande Karl Rahner, sj, nos impressiona. É uma lucidez que ultrapassa os tempos sem ser mágico. Dizia o teólogo em 1967:



“Num tempo futuro, haverá em várias partes do mundo, de certa forma dispersas e com diferentes graus de intensidade, comunidades cristãs, católicas. Em todos os lugares será um pequeno rebanho, já que a humanidade cresce com maior rapidez que a cristandade, já que os homens não serão cristãos pela força da herança e da tradição, da Instituição, da história, da homogeneidade de um ambiente social e de uma opinião pública, mais bem, precederão do fogo sagrado do exemplo familiar e da intimidade da casa paterna, da família e de pequenos grupos como suportes, unicamente por uma ação, própria da fé, dificilmente comparada e pela qual haverá sempre que luar de novo […] por todo canto haverá diáspora, e a diáspora estará em todos os lugares” (Rahner, Karl, Escritos de teologia. Tomo VI, Madrid, 1967, p. 470).


Interessante é que nem a tradição familiar e nem a Instituição terão força atrativa. E o que poderá ser atrativo? O Papa Bento XVI no discurso em Aparecida dizia que o discipulado não se dá pelo proselitismo, mas pela atração. Jesus é aquele que nos atrai e envia. Por outro lado já é possível encontrar nos ambientes familiares o pluralismo de crenças e o proselitismo, com muitas dificuldades de diálogo. Percebemos também o crescimento da intolerância que leva ao fanatismo. São situações às vezes de muitos contrastes e conflitos. Testemunhei na paróquia que trabalhei a tristeza de muitas pessoas que não entendiam como seus filhos e familiares trocavam de religião repentinamente e se sentiam perseguidos dentro de casa pelos constantes juízos e desprezos de suas crenças, sobretudo, com relação a veneração dos santos. Cria-se um conflito simbólico e ritual que deixa as pessoas perturbadas.

Certa vez uma senhora me confidenciou que não conseguia mais conviver com uma filha que freqüentava a igreja Assembléia de Deus e com uma irmã que tinha passado para a igreja do Evangelho Quadrangular. As três não conseguiam mais se entender nem mesmo no cotidiano da vida porque suas preferências e crenças interviam no relacionamento. Uma queria escutar os cantos da sua igreja todo o dia; a outra queria assistir os cultos para vários problemas pessoais e ela queria rezar o terço e não conseguia com tanto barulho dentro de casa. Aquilo era um inferno.


Caminhamos para novos tempos com certeza. Pequenas comunidades eclesiais que viverão a fé a partir das sensibilidades com as questões emergentes, cada vez mais dispersas nas grandes cidades, e as pessoas não serão necessariamente de origem católica. Passamos da época das massas e chegamos aos novos tempos da pessoa em relação. É a pessoa que decide e segue a crença que mais lhe sensibiliza e resolve seus problemas. É uma religião imaterial que busca preencher o vazio que a materialidade está produzindo no ser humano. Na realidade estamos vivendo tempos de uma nova civilização na qual o ser humano está sendo re-definido. Isto é muito interessante e ao mesmo tempo desafiador. Como evangelizar? Como ser presença discípula e missionária?

O documento de Aparecida nos chama ao discipulado e a missionariedade. Talvez ainda haja tempo de responder aos desafios sem cair no desespero de quem perdeu a passagem dos tempos. O discipulado é saber olhar o mundo com a visão de Jesus, aqui exige outra lógica e uma mística filial e política. Por mística filial entendo a total gratidão para com a gratuidade de Deus que entra neste mundo respeitando-o e salvando-o por dentro. Não adianta condenar o mundo, mas ser no mundo presença do Senhor que aceita nossa condição humana e nos ama com coração humano. A mística política é nossa prática solidária para com todos aqueles que são excluídos pelo mundo da gratuidade de Deus. Aqui agimos iluminados pelo Espírito Santo, ele é o perdão de Deus nesta historia dilacerada pelo pecado. Diante de nossos olhos estão as novas pobrezas humanas que clamam da terra aos céus por justiça. Na verdade vivemos na Sodoma e Gomorra, mas não queremos a destruição de nada e sim sua conciliação com Deus.

O grande testemunho do cristão católico místico e político será a generosa ação de santificação do mundo a partir da força eucarística. Ele que se faz pão e bebida verdadeira, nos ensina a ser alimento num mundo faminto e sedento. A comunidade cristã forma os galhos desta grande videira que dá o melhor vinho; o trigo que nos dá o melhor pão. É a multiplicação das obras de Deus numa comunidade, que mesmo sendo pequena semente de mostarda, se tornará uma grande obra missionária que chegará a todos sem distinção de raça, cor e credo. O que Deus quer é que todos cheguem a experiência da verdade que liberta e reconcilia.

A Igreja católica tem aqui seu papel fundamental. Ser o sinal que aponta desde o passado o sentido da fé no Deus da história. Uma história que ele escolheu livremente para entrar sem mudar absolutamente nada. Deus simplesmente se encarnou na história e se fez um de nós, mas ele não se conformou aos ditames desta história. Com sua vida ele a transformou desde as raízes mais profundas, descendo à mansão dos mortos, para tirar de lá o ser humano re-definido, nova criatura. Hoje somos cada vez mais pequenas comunidades, contudo, nossa força mística e profética se acentua porque somos impelidos a não medir nosso tamanho, mas a crer na força de Deus que tudo sabe e transforma. Tudo passa e passará, mas Deus jamais passará. Portanto, nossa missão é também escatológica, pois aponta para um futuro ainda em construção, mas sempre presente no aqui e agora da salvação.



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