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REITOR-MOR: DISCURSO DE CONCLUSÃO DO CG26

CG 26: Uma carta de navegação a caminho do Jubileu de 2015
segundo a marca do “Da mihi animas, cetera tolle”

Discurso de encerramento

Caríssimos irmãos,

concluímos hoje este Pentecostes salesiano. Sim! O Capitulo Geral 26 quis ser isto: um Pentecostes, um momento de particular abertura ao Espírito do Senhor. Ainda ressoam em nossos corações as palavras que o Papa Bento XVI nos transmitiu na mensagem à abertura da nossa reunião: «O carisma de Dom Bosco é um dom do Espírito a todo o Povo de Deus, mas só na escuta dócil e na disponibilidade à ação divina será possível interpretá-lo e torná-lo, também em nosso tempo, atual e fecundo… Ao derramar sobre os Capitulares a abundância de seus dons, Ele chegará ao coração dos Irmãos, e os fará arder do seu amor, inflamar-se do desejo de santidade, abrir-se à conversão, e os reforçará em sua audácia apostólica».

1. O evento capitular: breve crônica
Quisemos, de fato, viver o Capítulo justamente assim: sob a orientação do Espírito Santo, para que fosse Ele a ajudar-nos a entender melhor, atualizar e tornar fecundo o carisma do nosso Fundador e Pai. Durante estes dias, experimentamos a ação do Espírito, que inflamará o nosso coração para sermos testemunhas eloqüentes e corajosas do Senhor Jesus, para levar aos jovens a boa nova da sua ressurreição e propor-lhes a experiência alegre do encontro com Ele.

As jornadas vividas nos lugares salesianos (S. Francisco de Assis, Valdocco, Colle Don Bosco, Basílica de Maria Auxiliadora e Santuário da Consolata) foram esplêndidas, apreciadas por todos pela oportunidade de estar em contato imediato com o berço – carismático, espiritual e apostólico – da nossa Congregação. Para alguns era a primeira vez que tinham a alegria de visitar "os nossos lugares santos", para outros era a primeira vez que escutavam uma apresentação de Dom Bosco feita, não tanto de historietas de família a contar ou curiosidades históricas a esclarecer, mas como experiência espiritual e carismática a reviver. Aqueles dias foram para todos, afinal, um modo concreto – e espero – o primeiro passo para "partir de Dom Bosco".

Os frutos deverão ser copiosos: o desejo de maior aprofundamento da herança espiritual que nos foi transmitida, o empenho de tornar mais conhecidos Dom Bosco e a nossa história salesiana, a vontade de preparar formadores de salesianidade e, enfim, o desejo de valorizar mais esses lugares ligados ao nosso carisma.

A apresentação do estado da Congregação, através da relação audiovisual dos Dicastérios e das Regiões com a relação do Reitor-Mor, entendeu exprimir o propósito de ir além da entrega de um livro. O objetivo específico era informar pontualmente os Capitulares sobre o estado da Congregação para favorecer a sua visão global e o sentido de responsabilidade comum. A Congregação é de todos e somos todos co-responsáveis pelo seu crescimento, recursos, desafios.

Os Exercícios Espirituais foram vividos como verdadeiro exercício do Espírito, a superar a tentação de reduzir a proposta espiritual a um conjunto de temas de estudo ou atualização teológico-pastoral. Os dias de retiram serviram para criar a atmosfera de fé que é absolutamente indispensável para fazer do Capítulo uma experiência de escuta de Deus, docilidade ao Espírito, fidelidade a Cristo. Pareceram-me exemplares – também porque não é comum encontrar este ambiente em outras experiências de Exercícios Espirituais – o silêncio, a oração pessoal prolongada na adoração eucarística, a celebração da Reconciliação. Sublinhe-se também que os Exercícios deram-nos alguns elementos importantes de iluminação no que se refere à maior compreensão teológica do carisma, da missão e da espiritualidade salesiana.

Em sua realização concreta, os temas ofereceram-nos chaves significativas de leitura para aprender a ser homens de esperança, envolvidos no plano maravilhoso de Deus de salvar a humanidade, com a mística do "Da mihi animas", que faz do amor de Deus a força que arrasta, e com a ascética do "cetera tolle", que nos leva a entregar a nossa vida até o último respiro. Elemento importante a partir desta perspectiva foi o esclarecimento sobre a missão, que não consiste tanto em fazer coisas quanto em ser sinal do amor de Deus. Este Amor é justamente a única energia capaz de libertar, em cada um de nós, as melhores potencialidades. Sabemos que devemos viver tudo isso segundo a marca da gratuidade e da graça. Só assim alcança-se aquele dom especial de Deus, a "graça de unidade", pela qual tudo é consagração e tudo é missão. Em relação aos destinatários, ouvimos como Dom Bosco se sentiu carismaticamente "tocado" pelo perigo que podia pôr em risco a felicidade temporal e eterna, (a "salvação") dos jovens: o abandono no qual se podiam encontrar diante de Deus e dos outros, abandono provocado pela própria pobreza, às vezes dramática. Por tudo isso Dom Bosco é para nós pai, mestre e modelo. Ele, à escola de Maria Imaculada e Auxiliadora, quis caracterizar a sua identidade religiosa ao pôr como pontos básicos da sua vida o primado absoluto de Deus, o desejo de uma união contínua com Ele, para corresponder plenamente à sua vontade (obediência), como expressão de um amor total (castidade), no despojamento e na renúncia a tudo que pudesse impedir a sua mais completa entrega à missão (pobreza).

Agora, eu gostaria de repercorrer com os senhores as etapas deste caminho de Graça que foi o nosso Capítulo Geral.

A primeira semana do Capítulo (3-8 de março) foi dedicada aos procedimentos jurídicos ordinários (apresentação e aprovação do Regulamento do CG26, eleição dos Moderadores) e, sobretudo, ao estudo da Relação do Reitor-Mor pelas diversas Regiões. Estas, ao refletir sobre a Relação, individualizaram os grandes desafios que emergem do estado da Congregação e, conseqüentemente, as linhas de futuro a apresentar ao Reitor-Mor e ao seu Conselho em vista da programação de animação e governo para o sexênio 2008-2014.

O estudo da Relação foi um elemento fundamental para aprofundar o tema capitular, tendo em consideração que, mais do que nunca, este Capítulo se propunha não tanto a elaboração de um documento, quanto a renovação da vida da Congregação com o crucial apelo de "partir de Dom Bosco". Termos tomado consciência de onde estamos permite-nos descobrir melhor o caminho de "retorno a Dom Bosco", os elementos a recuperar para partir dele com renovado impulso.

A segunda semana (10-15 de março) foi toda empenhada no estudo dos três primeiros núcleos temáticos. Foram apresentadas também as questões enfrentadas pela Comissão Jurídica, especialmente aquelas que tinham a ver com a configuração do Conselho Geral. Era preciso, de fato, chegar às eleições tendo respondido aos questionamentos das Inspetorias ou de irmãos individualmente. Quanto ao estudo dos núcleos temáticos, foi valorizado de modo especial o "Instrumento de trabalho" como ponto de partida da reflexão capitular. De um lado, isso representava a prova evidente do bom trabalho realizado pela Comissão Pré-capitular, e de outro, sublinhava também a validade da contribuição oferecida pelos vários Capítulos Inspetoriais ao CG26. Estou contente por isso porque, como escrevera na carta de convocação, o CG26, como processo de reflexão, teve o seu início justamente nas Inspetorias, com o estudo dos temas propostos e a ativação do caminho de renovação. As Comissões trabalharam depois sobre um texto que era capitular e não mais pré-capitular, um verdadeiro documento de partida e não apenas um subsídio. As contribuições oferecidas pelas Comissões enriqueceram-no e aperfeiçoaram-no. Tratou-se de pontuações e alterações não só lingüísticas, mas que tendiam, sobretudo, a responder, de maneira adequada, à situação segundo a variedade dos contextos sociais, culturais, políticos e religiosos nos quais a Congregação está a trabalhar. Esta foi a tarefa da Assembléia que, com razão, tornou-se assim o verdadeiro autor do documento capitular.

A terceira semana (17-20 de março) foi centrada mais claramente no trabalho em Assembléia, para uma partilha do trabalho feito pelas Comissões. Foi o momento em que pôde ter espaço também o pensamento e a preocupação de cada capitular que entendia ajudar a iluminar o tema, dar voz a sensibilidades e visões diversas, favorecer, sobre os diversos aspectos, uma votação do documento que fosse mais consciente, mais pessoal, mais responsável. Deveria ser realçado o fato de ter freqüentemente brotado das intervenções o que mais nos preocupa. Assim, por exemplo, ao falar da urgência de evangelizar, evidenciou-se que ela deve ser entendida e vivida no modo como nós salesianos evangelizamos; e isto quer em relação aos nossos destinatários prioritários (os jovens) quer às modalidades da evangelização. Ao falar da necessidade de convocar, isso deve ser feito com a mesma convicção de Dom Bosco, para ajudar os jovens a descobrirem o sonho de Deus sobre a sua vida e encorajá-los a dar a Deus ao menos uma oportunidade. As vocações – eu mesmo o dizia no discurso de abertura – não são uma missão, mas o fruto da missão, quando ela é bem feita. Se acrescentarmos a isso a constatação das imensas multidões de jovens que vivem em situações de extrema precariedade e luta pela própria sobrevivência, ou de outros que, embora sem problemas de pobreza material, levam a vida "sem bússola", ou até mesmo esbanjam este dom precioso com opções que não satisfazem ou se tornam caminho de autodestruição, não podemos deixar de trabalhar para que as vocações amadureçam. Ao falar da pobreza evangélica, vemos nela um convite do Senhor a tornar nossa a sua bem-aventurança, a viver livres da preocupação dos bens terrenos, a superar a tentação do enriquecimento, a assumir um estilo de vida austero, simples, que liberte o nosso coração e a nossa mente de tantas coisas que criam obstáculo à nossa entrega total à missão, e que nos tornam menos críveis. A riqueza é um verdadeiro perigo: ela torna os homens míopes perante os valores duradouros (ver o rico estulto, Lc 12,13-21), duros de coração diante dos pobres (ver a parábola do pobre Lázaro e o rico epulão, Lc 16,19-31), idólatras a serviço de Mamon (ver as palavras de Jesus sobre o uso do dinheiro, Lc 16,19-13). Trata-se de um dos temas mais candentes, mas também de uma opção que tem grande força libertadora para nós e para os outros. E ainda: quando se fala de novas fronteiras devemos fazê-lo não à moda de ativistas dos direitos humanos, nem como bem intencionados colaboradores de ONGs, mas como educadores consagrados, que procuram responder às carências dos jovens sem prejudicar as nossas obras, que prestam um serviço significativo. Aqui insisto, por isso, no que disse na "Síntese Global e Visão Profética" da minha relação inicial: é importante que as obras respondam às necessidades dos jovens, com novas presenças, lá onde elas são necessárias, ou com presença renovada, lá onde já estamos, mas precisamos renovar-nos.

A quarta semana (24-29 de março) foi vivida em clima de discernimento para a eleição do Reitor-Mor, do seu Vigário e dos Conselheiros. Era um dos objetivos principais e, ao mesmo tempo, uma das tarefas mais delicadas do Capítulo Geral. Guiados pelo P. José Maria Arnaiz, conseguimos, como capitulares, entrar naquela atmosfera espiritual que nos fez conscientes, livres e responsáveis para expressar o nosso parecer através do voto pessoal. Em geral, todas as eleições foram vividas com tranqüilidade, embora, na avaliação feita ao final, tenha sido salientada a necessidade de favorecer um maior conhecimento das expectativas sobre cada Dicastério ou Região e definir melhor o perfil do Conselheiro a ser eleito, com informações melhor cuidadas sobre os nomes dos possíveis candidatos. Não resta dúvida que na composição do Conselho Geral intervêm muitos fatores: antes de tudo, os sentimentos daqueles cujos nomes são apresentados como candidatos, depois a sensibilidade cultural no desenvolvimento do processo, além do desejo legítimo de buscar a representatividade de toda a Congregação. Entretanto, a elevada convergência alcançada na eleição do Reitor-Mor e de todos os Conselheiros foi sinal de unidade da Congregação na diversidade das realidades que a constituem.

Esta unidade na diversidade teve a sua particular expressão na noite de festa e fraternidade após a eleição do Reitor-Mor. O longo aplauso dado aos Conselheiros que terminaram o seu serviço (P. Antonio Domenech, P. Gianni Mazzali, P. Francis Alencherry, Mons. Tarcisio Scaramussa, P. Albert Van Hecke, P. Filiberto Rodríguez, P. Joaquim D’Souza, compreendidos os Conselheiros falecidos no exercício do próprio serviço, P. Valentín de Pablo e P. Helvécio Baruffi) foi a expressão de reconhecimento pelo serviço realizado em favor da Congregação, na animação de um Setor ou de uma Região. Ainda a respeito das eleições não se pode deixar de sublinhar uma novidade muito significativa como foi a nomeação do primeiro Salesiano Coadjutor como membro do Conselho Geral.

A quinta semana (31 de março – 5 de abril) teve início com a visita ao Vaticano e a Audiência com o Santo Padre. A visita à Basílica de São Pedro, onde fomos acolhidos pelo Card. Angelo Comastri, Arcipreste da Basílica, deu-nos a graça de renovar a nossa profissão de fé diante da urna das relíquias do Apóstolo Pedro e rezar diante da estátua de Dom Bosco, a pedir a coragem de poder gritar como ele "Da mihi animas, cetera tolle". O encontro com o Papa Bento XVI foi depois um dos eventos culminantes do CG26, em sintonia com a visão eclesial e espiritual de Dom Bosco. As palavras do Santo Padre aos Capitulares foram acolhidas como linhas iluminadoras e programáticas. Nos dias seguintes, as Comissões e a Assembléia retomaram o estudo da primeira redação do Grupo de redação. Continuou-se assim o trabalho feito durante a Semana Santa, antes da semana das eleições, ao retomar o estudo dos cinco núcleos em comissão e assembléia. Fez-se ainda uma votação de mérito para os diversos temas apresentados pela Comissão Jurídica. A semana terminou com a visita às Catacumbas de São Calisto, onde quisemos ir para fazer reconhecida memória, em particular, dos Reitores-Mores P. Luís Ricceri, P. Egídio Viganò e P. João Edmundo Vecchi, detendo-nos em oração no hipogeu onde estão sepultados, depois da celebração eucarística e do almoço. Em minha oração pessoal quis agradecer ao Senhor pelo dom que fez à Congregação através de cada um deles. Ao pedir a ajuda e a intercessão dos meus predecessores, pedi também para todos os Irmãos a graça de saber caminhar até as fontes da nossa própria identidade ("retornar a Dom Bosco") para encontrar um caminho de futuro ("partir de Dom Bosco"). O nosso futuro caminho de fidelidade nasce da fidelidade que nos precedeu.

Não lhes escondo que me perguntei com freqüência: «Mas será esta realmente uma experiência pentecostal? E o Espírito Santo age realmente através de nós para renovar a Congregação aquecendo o coração dos irmãos?» Creio que sim. O Espírito Santo não muda as situações exteriores da vida, mas as interiores; Ele tem o poder de renovar as pessoas e transformar a terra. Ele agiu antes de tudo em cada um de nós, ao reunir-nos, envolver-nos num projeto comum, fazer-nos responsáveis pela elaboração de tudo que torne possível uma retomada da identidade, visibilidade, credibilidade da nossa vida e da nossa missão.

Em relação ao trabalho feito pela Comissão Jurídica, ela examinou cada proposta que veio dos Capítulos Inspetoriais, de cada irmão, do Conselho Geral, dos Capitulares. Tudo em vista de uma apresentação clara à Assembléia que, depois, haveria de exprimir o próprio parecer. Ao ler a história da Congregação, percebemos o peso que vários Capítulos Gerais tiveram na configuração das estruturas de animação e de governo nos diversos níveis (local, inspetorial e mundial). Certamente, foram necessários vários Capítulos Gerais para se chegar a algumas mudanças nas estruturas; não por devido à lentidão ou falta de coragem para introduzir modificações significativas, mas, sobretudo porque nem sempre se podia ter uma visão completa do que entrava em jogo com essas opções. O retorno à reflexão, também nesse Capítulo Geral, sobre alguns aspectos da atual configuração do Conselho Geral significa que há necessidade de um estudo sério, com soluções alternativas, que apresente uma proposta realmente inovadora e válida em sua integridade. Disso tudo nasceu a primeira orientação aprovada pela Assembléia Capitular: fazer ao longo do sexênio, uma revisão do Governo central da Congregação (composição e funcionamento), de tal modo que o seu serviço seja mais eficaz e próximo dos irmãos.

2. Leitura ‘profética’: para uma “compreensão” do que aconteceu

O Capítulo produziu um documento, com cinco fichas de trabalho, interdependentes entre si, sobre os grandes temas já indicados na carta de convocação: "Retorno a Dom Bosco para partir dele"; "Urgência de evangelizar"; "Necessidade de convocar", "Pobreza evangélica" e "Novas fronteiras". Estas fichas de trabalho quiseram dar consistência ao lema "Da mihi animas, cetera tolle", ao aplicar o esquema já conhecido do CG25 (Chamado de Deus, Situação, Linhas de ação) e enriquecido com alguns critérios de revisão, que acrescentam os horizontes a alcançar: mentalidade a amadurecer e estruturas a mudar.

Acredito que o documento final é realmente bom e construtivo, pois leva em conta a variedade de contextos e situações em que a Congregação se encontra a encarnar o carisma de Dom Bosco. Cabe agora a cada Região e Inspetoria o trabalho de contextualizar as grandes linhas de ação, com as intervenções decorrentes, a fim de torná-las mais correspondentes às situações e aos desafios concretos.

Estou certo que todos os Irmãos encontrarão páginas estimuladoras que ajudem a dinamizar a própria vida e qualificar a missão salesiana. Talvez o conjunto possa parecer não tão radical; mas, estou convencido que, se levado a peito, suscitará entusiasmo e, sobretudo, permitirá a todos renovar-se espiritualmente e recuperar o ímpeto apostólico.

O documento pressupõe um bom conhecimento da realidade social e também a da Congregação e exprime o desejo de operar uma transformação nelas. Isso nos foi recordado pelo Santo Padre no Discurso ao CG26, em 31 de março: «O vosso XXVI Capítulo Geral situa-se num período de grandes mudanças sociais, econômicas, políticas; de acentuados problemas éticos, culturais e ambientais; de conflitos ainda sem solução entre etnias e nações. Neste nosso tempo há, por outro lado, comunicações mais intensas entre os povos, novas possibilidades de conhecimento e de diálogo, um confronto mais vivo sobre os valores espirituais que dão sentido à existência. Em particular, os apelos que os jovens nos dirigem, sobretudo seus questionamentos sobre os problemas fundamentais, fazem referência aos intensos desejos de vida plena, de amor autêntico, de liberdade construtiva nutridos por eles. São situações que interpelam a fundo a Igreja e a sua capacidade de anunciar hoje o Evangelho de Cristo com toda a sua carga de esperança».

De fato, não se pode falar de evangelização ou de vocação, da simplicidade de vida e das novas fronteiras sem ter em mente o cenário onde vivemos e trabalhamos e os desafios que a vida salesiana e a missão estão a encontrar.

Tivemos em mente os rostos e as urgências dos jovens mais carentes, destinatários da nossa missão. Escolhemo-los como "prediletos" por nós, justamente porque a predileção pelos pobres "é implícita à fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para enriquecer-nos com a sua pobreza". Esta fé foi assumida por Dom Bosco e passada à tradição salesiana (cf. Const. 11).

Quais são então as chaves de leitura do documento?

A primeira: Aquecer o coração dos irmãos, a partir de Cristo e de Dom Bosco. Não se trata de uma operação para suscitar sentimento superficial ou entusiasmo passageiro. O que está em jogo é a trabalhosa e urgente tarefa da conversão, do retorno ao deserto – como foi para Israel –, para ali encontrar o amante dos primeiros dias, aquele que nos encantou e encheu a nossa vida de promessas e de futuro (cf. Os 2,16-25). Precisamos de um encontro com o Senhor que venha falar-nos ao coração, que nos ajude a reencontrar as nossas melhores energias, aquelas que brotam do coração; que venha dar novamente alegria e encanto à nossa vida, que venha nos ajudar a aprofundar as nossas motivações, reforçar as nossas convicções, estimular-nos num caminho marcado pela fidelidade à aliança, ordenar a nossa vida pessoal, comunitária e institucional segundo os valores do Evangelho e segundo o carisma de Dom Bosco.
Vem-me à mente a história daquele monge "bom e conformista", que vai ter com o seu Abade a pedir um conselho para melhorar a sua vida, conforme as narrações dos Padres do deserto:
Aconteceu certa vez – conta-se – que Abba Lot foi encontrar o Abba José e lhe disse:
– Abba, sigo o quanto posso uma pequena regra, pratico todos os pequenos jejuns, faço um pouco de oração e meditação, mantenho-me sereno e, naquilo que me é possível, conservo puros os meus pensamentos. O que devo fazer?
Então, o velho monge pôs-se em pé, levantou as mãos ao céu e seus dedos converteram-se em dez tochas de fogo. E disse:
– Por que não te transformas em fogo?
Eis o objetivo a alcançar com este Capítulo: transformar-nos em fogo! A história reporta-nos diretamente à eloqüente e expressiva cena de Pentecostes: «Apareceram-lhes como que línguas de fogo que se dividiam e pousaram sobre eles; e eles ficaram todos cheios de Espírito Santo» (At 2,3-4a). "Aquecer o coração" não significa outra coisa que transformar-se em fogo, ter os pulmões cheios de Espírito Santo.

Tudo isso está em sintonia com o aquele que foi o lema do Congresso sobre a Vida Consagrada (novembro de 2004), no qual quisemos interpretar e viver a nossa vida religiosa, a partir de uma grande paixão por Cristo e uma grande paixão pela Humanidade.

À luz destas duas grandes paixões, as principais prioridades são:
A espiritualidade. Esta comporta um esforço todo particular para que a Palavra de Deus e a Eucaristia sejam verdadeiramente o centro da vida do consagrado e da sua comunidade. Estamos convencidos que a pessoa consagrada deve ser sinal e memória viva da dimensão transcendente que existe no coração de cada ser humano.
A comunidade. Estamos conscientes que o testemunho da comunhão, aberta a todos os que precisam, é fundamental em nosso mundo e torna-se não só sustento para a fidelidade dos religiosos, como também testemunho de uma forma alternativa de vida ao modelo imperante, que nos faz refluir com freqüência para formas de individualismo.
A missão, a realizar e viver, sobretudo nas fronteiras missionárias como a exclusão, a pobreza, a secularização, a reflexão, a formação e a educação em todos os níveis.

Parecem-nos estes os "lugares" nos quais os consagrados devem estar presentes para exprimir a dimensão missionária da Igreja. A missão, porém, compreende também a "paixão" – entendida como sofrimento ou enfermidade – de tantos que continuam a rezar pela Igreja e pelos operários de messe, e "paixão" como martírio de tantos religiosos encarcerados ou trucidados por causa do Reino. Eles são a melhor expressão do Evangelho.

Se quisermos sentir arder o nosso coração e inflamar de paixão o dos irmãos, precisamos percorrer a mesma estrada dos discípulos de Emaús. "Trata-se – dizia na homilia do dia seguinte à minha reeleição – mais que uma vida material, de um percurso mistagógico, de um autêntico itinerário espiritual, válido hoje, antes de tudo, porque evidencia aquela que é a nossa situação: pessoas desencantadas, que têm um conhecimento de Jesus, mas sem uma verdadeira experiência de fé; conhecem as Escrituras, mas não encontraram a Palavra. Por isso, abandona-se Jerusalém e a comunidade apostólica e retorna-se ao que se vivia antes. A estrada de Emaús é um caminho que nos leva da Escritura à Palavra, da Palavra à Pessoa de Cristo na Eucaristia, e dela nos leva de volta à comunidade para ali ficar. Ali podemos ver confirmada a nossa fé ao encontrar os irmãos: «De fato, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!»".

A segunda chave de leitura é a Missionariedade ou a urgência de evangelizar, levados não pela ansiedade de proselitismo, mas pela paixão da salvação dos outros, pela alegria de compartilhar a experiência de plenitude de vida em Jesus.

Durante o Capítulo, um dos núcleos e, ao mesmo tempo, também um tema transversal foi precisamente o da urgência de evangelizar. O Apóstolo Paulo exprimia-o com uma espécie de imperativo existencial: «Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho!» (1Cor 9,16b.). Este intenso sentido missionário encarna perfeitamente a ordem dada por Jesus aos seus discípulos: Sejam minhas "testemunhas até os extremos limites da terra" (At 1,8). Dom Bosco fez seu esse apelo premente de Jesus e, logo depois da aprovação das Constituição (1874), em 11 de novembro de 1875, enviou a primeira expedição missionária à América Latina.

O CG26 convida-nos a colocar-nos em sintonia com aquela que foi a inspiração originária de Dom Bosco, a dimensão missionária da sua vida, mas também do seu carisma. Tudo isso representa um ponto fundamental do testamento espiritual que ele nos deixou. O Capítulo a pouco concluído oferece-nos a oportunidade de entender melhor qual a resposta que hoje somos chamados a dar.

A urgência da missionariedade é particularmente viva hoje porque, em primeiro lugar o mundo todo voltou a ser "terra de missão"; em segundo lugar porque, hoje, há uma maneira diversa de conceber a missionariedade, de realizar a "missio ad gentes". Ela é atuada, de fato, no respeito aos diversos ambientes culturais, em diálogo com as demais confissões cristãs e as diversas religiões, e empenha-nos na promoção humana e na fermentação da cultura (cf. EM 19).

Mas, de onde brotava a missionariedade de Dom Bosco? Quais foram as razões do seu imenso zelo missionário?

Segundo meu modo de ver há três grandes elementos, que devem constituir um ponto de referência para todos nós.

O primeiro é ser obediente à ordem do Senhor Jesus, que no momento da Ascensão, antes de deixar este mundo para subir ao Pai, disse-nos: «sereis minhas testemunhas até os extremos limites da terra» (At 1,8). Deu-nos assim o mundo todo como campo de evangelização e isso até o fim da história. Para nós Salesianos, como em geral para todos os crentes, a primeira razão para ser evangelizadores é, portanto, a obediência ao mandato do Senhor Jesus.
O segundo elemento da dimensão missionária de Dom Bosco é a convicção do valor fermentador e da função transformadora que o Evangelho tem, a sua capacidade de fermentar todas as culturas. Na magna carta da evangelização, a Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi de 1975, Paulo VI escreveu que o Evangelho pode ser inculturado em todas as culturas, ou seja, pode-se exprimir de maneiras diversas segundo as culturas, sem que se identifique com nenhuma delas. Nem mesmo com a cultura judaica na qual Jesus nasceu, no sentido que nenhuma cultura concorda plenamente com a novidade do Evangelho. Por isso, todas as culturas são chamadas a deixar-se purificar e elevar. Não há evangelização autêntica, se ela não tocar a alma da cultura, aquele conjunto de valores aos quais se referem os centros de decisão da pessoa. Toda cultura é importante, porque representa o espaço onde as pessoas nascem, crescem, desenvolvem-se, aprendem a relacionar-se, a enfrentar a vida, mas deve-se reconhecer também que toda cultura tem seus limites e precisa da luz do Evangelho. Hoje, pois, quando falamos da urgência de evangelizar, não estamos a pensar apenas na Oceania, Ásia, África, América Latina, mas também na Europa, que, mais do que nunca, precisa do Evangelho e do carisma salesiano.
O terceiro elemento, muito específico do carisma de Dom Bosco, é a sua predileção pelos jovens, conscientes que nas políticas dos governos e no tecido social dos povos, malgrado todas as declarações, eles não contam e parecem ter que se resignar a ser apenas consumidores de produtos, experiências e sensações. Isso, porém, não corresponde ao Evangelho, à praxe e à lógica de Jesus que, quando lhe fizeram a pergunta «Quem é o mais importante?», chamou uma criança que estava por perto e colocou-a no centro. Pôr os jovens no centro da nossa atenção missionária! Este é um dos elementos mais específicos do rico patrimônio espiritual que Dom Bosco nos deixou. E a tarefa que nos é confiada é a de levá-lo a todas as culturas aonde nós vamos e trabalhamos e, aonde, com freqüência, os jovens não contam. A grandeza de Dom Bosco foi justamente esta: ter feito dos jovens protagonistas, não só da própria educação, mas também da sua experiência pedagógica e espiritual. Dom Bosco, ao inaugurar caminhos novos como sacerdote, acreditou nos jovens e gastou-se totalmente com o seu gênio apostólico, para garantir-lhes oportunidades de desenvolver todas as suas dimensões e energias de bem, fazer valer os seus direitos, torná-los responsáveis (sobretudo os melhores) da continuação da sua obra na história.

No Capítulo, depois de ter insistido sobre a urgência de evangelizar, recordamos que nós Salesianos realizamos esta missão segundo o carisma pedagógico que nos é próprio. "A pastoral de Dom Bosco jamais se reduz apenas à catequese ou apenas à liturgia, mas abraça todos os concretos empenhos pedagógico-culturais da condição juvenil. (…) Trata-se daquela caridade evangélica que se concretiza (…) no libertar e promover o jovem abandonado e desviado".

Se não é salesiana aquela educação que deixa de abrir o jovem a Deus e ao destino eterno do homem, não o é também a evangelização que deixe de mirar a formação de pessoas maduras em todos os sentidos e que não saiba adaptar-se à condição evolutiva do menino, do adolescente, do jovem, ou respeitá-la.

É verdade que, em alguns contextos secularizados, a Igreja encontra dificuldades particulares de evangelizar as novas gerações. Embora, evidentemente, as sondagens e estatísticas não sejam a última palavra e devam-se considerar diversas tipologias de vivência religiosa, que compreendem também formas de intensa espiritualidade, não se pode negar que em vários países existem sinais de uma progressiva cristianização. Nota-se que tanto a prática religiosa como as convicções profundas são mais frágeis entre os jovens. "Trata-se do estrato da população mais sensível às modas culturais e, certamente, mais atingido pela secularização ambiental". Parece existir um divórcio entre as novas gerações de jovens e a Igreja. A ignorância religiosa e os preconceitos assumidos acriticamente todos os dias por certos meios de comunicação alimentaram neles a imagem de uma Igreja-instituição conservadora, que vai contra a cultura moderna, sobretudo no campo da moral sexual. Torna-se normal, por isso, para muitos deles desvalorizar ou relativizar todas as ofertas religiosas que lhes são propostas.

Outro drama particularmente grave é a ruptura criada na cadeia de transmissão da fé de uma geração a outra. Os espaços naturais e tradicionais (família, escola, paróquia) revelam-se ineficazes para a transmissão da fé. Cresce, então, a ignorância religiosa nas novas gerações e assim continua entre os jovens a "emigração silenciosa extramuros da Igreja". "As crenças religiosas tingem-se de pluralismo e seguem sempre menos um cânon eclesial; descem, portanto, lentamente os níveis da prática religiosa: sacramentos e oração".

Não é fácil definir a imagem que os jovens têm de Deus, mas certamente o Deus cristão perdeu a centralidade diante de um Deus midiático que leva à divinização das figuras do mundo do esporte, da música, do cinema. O jovem sente paixão pela liberdade e não se detém diante da porta das igrejas. São muitos os jovens que pensam que a Igreja é um obstáculo à sua liberdade pessoal.

Diante da situação podemos perguntar-nos: qual a educação oferecida pelas instituições escolares e eclesiais? Por que a questão religiosa foi cancelada do horizonte vital dos jovens? O menino, o adolescente, o jovem são generosos por natureza e entusiasmam-se pelas causas que valham realmente à pena. Por que, então, Cristo deixou de ser significativo para eles?

Se quiser permanecer fiel à sua missão de sacramento universal de salvação, a Igreja deve aprender as linguagens dos homens e das mulheres de cada tempo, etnia e lugar. E nós Salesianos, de modo particular, devemos aprender e utilizar a linguagem dos jovens. Não resta dúvida que na Igreja de hoje, mas também no interior das nossas instituições, existe um "sério problema de linguagem". Trata-se, no fundo, de um problema de comunicação, de inculturação do Evangelho nas realidades sociais e culturais; um problema de educação à fé para as novas gerações. Eis, portanto o desafio e a tarefa para nós hoje: ser educadores capazes de comunicar-nos com os jovens e transmitir-lhes o grande tesouro da fé em Jesus Cristo.

A educação salesiana, na transmissão da fé e dos valores, parte sempre da situação concreta de cada pessoa, da sua experiência humana e religiosa, das suas angústias e ansiedades, das suas alegrias e esperanças, a privilegiar sempre mais a experiência e o testemunho. Preocupa-se com a pedagogia da iniciação cristã, de tal modo que Cristo seja aceito mais como o amigo que nos salva e nos faz filhos de Deus, do que como legislador, que nos sobrecarrega de dogmas, preceitos ou ritos. Evidenciam-se os aspectos positivos e festivos de qualquer experiência religiosa, fiéis a Dom Bosco no sonho dos nove anos: "Põe-te imediatamente a instruí-los sobre a fealdade do pecado e a preciosidade da virtude".

"Evangelizar educando" quer dizer para nós saber propor a melhor das notícias (a pessoa de Jesus) ao adaptar-nos e respeitarmos a condição evolutiva do menino, do adolescente, do jovem. O jovem busca a felicidade, a alegria da vida e ao ser generoso é capaz de sacrificar-se para alcançá-las, se realmente lhes mostrarmos um caminho convincente e se nos oferecermos como competentes companheiros de viagem. Os jovens estavam convencidos que Dom Bosco os amava, desejava a felicidade deles aqui na terra e na eternidade. Por isso, aceitavam o caminho que ele lhes propunha: a amizade com Jesus, Caminho, Verdade e Vida.

Dom Bosco ensina-nos a ser ao mesmo tempo educadores e evangelizadores ("graça de unidade"). Como evangelizadores conhecemos e buscamos a meta: levar os jovens a Cristo. Como educadores precisamos saber partir da situação concreta do jovem e conseguir encontrar o método adequado de acompanhá-los em seu processo de amadurecimento. Se como pastores seria uma vergonha renunciar à meta, como educadores seria uma falência não conseguir encontrar o método adequado a fim de motivá-los para iniciarem o caminho e acompanhá-los com credibilidade.

A terceira chave de leitura è o tema das "Novas fronteiras" como lugar natural para a vida consagrada e como chamado a estar presente nos lugares de maior degrado e carência, do ponto de vista religioso e cultural, ecológico, social.

Conscientes que a missão é a razão do nosso ser salesianos e que as carências e expectativas dos jovens determinam as nossas obras, no Capítulo Geral um dos temas mais debatidos foi justamente o das "novas fronteiras", lá onde os jovens nos esperam. São fronteiras não só geográficas, mas econômicas, sociais, culturais e religiosas. Aqui devemos agir com o critério que orientou as opções de Dom Bosco, ou seja, "dar mais a quem teve de menos".

Fico contente que vai crescendo, há anos, na Congregação a sensibilidade e a preocupação, a reflexão e o trabalho pelo mundo da marginalização e do desconforto dos jovens. Esta realidade já não representa um setor particular, identificado com alguma obra especial ou animado apenas por algum irmão especialmente motivado. A atenção aos últimos, aos mais pobres, aos mais insatisfeitos está a se tornar uma "sensibilidade institucional" que, aos poucos, envolve muitas obras das Inspetorias. Multiplicaram-se as plataformas sociais, deu-se lugar ao trabalho em rede e vai-se agindo em sinergia com outras agências que trabalham no mesmo campo. É como se tivesse começado a "sair para fora dos muros", a girar pela cidade e escutar o clamor e o pedido de ajuda dos jovens. Tudo isso, para nós, significa renovar a predileção pelos mais pobres, pelos mais abandonados e por aqueles que estão em situação de risco psicossocial: jovens arruinados, maltratados, vítimas de abusos e opressões. Com o mesmo coração de Dom Bosco, sentimos o dever de encontrar novas formas de oposição ao mal que angustia tantos jovens. Sentimos também o dever de inverter a tendência cultural e social, sobretudo através do que é a nossa riqueza específica: sermos portadores de um sistema educativo capaz de mudar o coração dos jovens e transformar a sociedade. Não podemos dar como caridade aquilo que lhes cabe por justiça. Neste ano, em que se celebra o 60º aniversário da Declaração dos Direitos Humanos, devemos dar um passo adiante e organizar todo o nosso projeto educativo na órbita dos direitos dos menores, como eu indicava na Estréia 2008.

A recordar a experiência de Dom Bosco

Ao acolher o que o próprio Dom Bosco escreveu nas "Memórias do Oratório", a experiência que o perturbou e solicitou a uma nova maneira de ser padre foi o seu contato com os jovens da prisão de Turim. Ele conta com estas palavras: "Ver turmas de jovens, de 12 a 18 anos, todos eles sãos, robustos, e de vivo engenho, mas sem nada fazer, picados pelos insetos, à míngua de pão espiritual e temporal, foi algo que me horrorizou".

Eis o primeiro elemento a registrar: Dom Bosco viu, escutou, soube colher a realidade social, ler o seu significado e tirar as suas conseqüências. Desta experiência nasceu em Dom Bosco uma imensa compaixão por aqueles garotos. No contato com eles, sentiu a urgência de oferecer-lhes um ambiente de acolhida e uma proposta educativa segundo suas necessidades: "Nessas ocasiões descobri que muitos voltavam àquele lugar porque abandonados a si próprios. Quem sabe – dizia de mim para mim –, se tivesse lá fora um amigo que tomasse conta deles, os assistisse e instruísse na religião nos dias festivos, quem sabe não se poderiam manter afastados da ruína ou pelo menos não diminuiria o número dos que retornam ao cárcere? Comuniquei esse pensamento ao padre Cafasso, e com o seu conselho e com suas luzes pus-me a estudar a maneira de levá-lo a efeito".

E eis o segundo elemento a reconhecer na experiência do nosso Pai Dom Bosco: a fantasia pastoral, que o levou a criar com imaginação e generosidade respostas adequadas aos novos desafios. Tudo isso implicava assumir a responsabilidade em primeira pessoa e criar as estruturas que pudessem tornar possível um mundo melhor e alternativo para aqueles garotos.

É assim que Dom Bosco pensa antes de tudo em prevenir estas experiências negativas, ao acolher os jovens que chegam à cidade de Turim em busca de trabalho, os órfãos ou aqueles cujos pais não podem ou não querem tomar conta, aqueles que vagam pela cidade sem um ponto de referência afetiva e uma possibilidade material de vida digna. Oferece-lhes uma proposta educativa, centrada na preparação ao trabalho, que os ajuda a recuperar confiança neles próprios e o sentido da sua dignidade. Oferece um ambiente positivo de alegria e amizade, no qual assumam como que por contágio os valores morais e religiosos. Oferece uma proposta religiosa simples, adequada à idade deles e, sobretudo alimentada num clima positivo de alegria e orientada pelo grande ideal da santidade.

Consciente da importância da educação da juventude e do povo para a transformação da sociedade, Dom Bosco faz-se promotor de novos projetos sociais de prevenção e assistência. Pense-se na relação com o mundo do trabalho, nos contratos com os patrões, no tempo livre, na promoção da instrução e cultura popular. Mesmo que Dom Bosco não tenha falado explicitamente dos direitos dos meninos – não estava na cultura do tempo – agiu para dar-lhes dignidade e inseri-los na sociedade em condições tais que pudessem enfrentar com êxito a vida (“empowerment”).

Eis, enfim, o terceiro elemento, muito significativo no meu modo de ver, que caracterizou a experiência de Dom Bosco. Ele percebeu não ser suficiente aliviar a situação de desconforto e abandono em que viviam os seus jovens (ação paliativa). Sentiu-se, sempre mais claramente, levado a fazer uma mudança cultural (ação transformadora), através de um ambiente e de uma proposta educativa que pudessem envolver muitas pessoas identificadas com ele e com a sua missão. Tudo isso representou não só o início de uma instituição (o Oratório de Valdocco), como também o primeiro desenvolvimento daquela intuição particular que levou Dom Bosco a dar início a um vasto movimento para a salvação da juventude: a Família Salesiana (cf. Const. 5). As carências eram muitas. Procurou então, antes de tudo, a colaboração de sua mãe, depois a de alguns sacerdotes diocesanos. Com seus melhores jovens deu início à Sociedade de São Francisco de Sales, depois fundou o Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora e pôs em ação a Associação dos Cooperadores. Sua mente era um contínuo "sonho do bem dos jovens". O seu coração era uma contínua "expressão do mor de Deus pelos jovens".

Nós, como Salesianos, continuamos a cultivar no coração esta paixão pelos mais pobres, pelos abandonados, pelos últimos. Quanto mais conheço a Congregação, alargada nos cinco continentes, mais reconheço que como Salesianos tentamos ser fiéis a este critério fundamental de estar próximos e solidários com os mais carentes, a tomar a peito aquelas realidades juvenis que a sociedade não quer ver: meninos de rua, adolescentes soldados, crianças operárias, jovens desfrutados pelo maldito turismo sexual, dispersos pela guerra, imigrantes, vítimas do álcool e da droga, doentes de HIV/AIDS, jovens sem sentido religioso… Como dizia acima, constatamos que hoje a sensibilidade entre nós cresceu e, graças a Deus, continua a crescer. Hoje, o trabalho dos pioneiros foi assumido pela Instituição e, sobretudo, vai-se adquirindo uma mentalidade que nos permite estar em todos os lugares com esta chave de leitura, a fazer a opção em favor dos mais excluídos e marginalizados. É uma graça ouvir que na Congregação está a crescer esta mentalidade: "dar mais a quem recebeu de menos".

Enquanto nos países em vias de desenvolvimento predominam rostos de jovens marcados pela pobreza material, nos países desenvolvidos a marca que os caracterizam é a perda do sentido da vida, a capitulação ao consumismo, ao hedonismo, ao indiferentismo, à dependência das drogas. As respostas devem ser necessariamente diferenciadas.

À luz destas grandes dimensões que podem e devem mudar a nossa vida e atividade apostólica torna-se mais evidente e imperiosa a nossa necessidade de conversão à essencialidade, a uma vida pobre, austera e simples, que seja expressão do total desapego de tudo que nos possa impedir de nos entregarmos até o fim àqueles que o Senhor nos confiou.

3. Opções feitas e encaminhamentos para torná-las operativas: perspectivas de animação e governo.

As dimensões mencionadas acima tiveram sua primeira tradução nas várias fichas do documento. Com efeito, as grandes opções do CG26 para o renascimento espiritual e o ímpeto apostólico foram expressas nas "Linhas de ação" de cada tema. Elas dão-nos algumas orientações a assumir, a fazer passar do papel à vida. Realmente, elas não podem ser simples declarações de intenções, mas um verdadeiro programa de vida, de animação e governo, de proposta educativo-pastoral.

Para o tema "Partir de Dom Bosco", deliberamos:
Retornar a Dom Bosco
Linha de ação 1
Esforçar-se por amar, estudar, imitar, invocar e tornar Dom Bosco conhecido, para partir dele.

Retornar aos jovens
Linha de ação 2
Retornar aos jovens, especialmente os mais pobres, com o coração de Dom Bosco.

Identidade carismática e paixão apostólica
Linha de ação 3
Redescobrir o significado do Da mihi animas cetera tolle como programa de vida espiritual e pastoral.

Para o tema "Urgência de evangelização", deliberamos:

Comunidade evangelizada e evangelizadora
Linha de ação 4
Colocar o encontro com Cristo na Palavra e na Eucaristia como centro de nossas comunidades, para sermos discípulos autênticos e apóstolos críveis.

Centralidade da proposta de Jesus Cristo
Linha de ação 5
Propor aos jovens, com alegria e coragem, a vivência da existência humana como ela foi vivida por Jesus Cristo.

Educação e evangelização
Linha de ação 6
Cuidar, em todos os ambientes, da integração mais eficaz entre educação e evangelização, na lógica do Sistema Preventivo.

Evangelização nos diversos contextos
Linha de ação 7
Inculturar o processo de evangelização para responder aos desafios dos contextos regionais.

Para o tema "Necessidade de convocar", deliberamos:

Testemunho como primeira proposta vocacional
Linha de ação 8
Testemunhar com coragem e alegria o fascínio de uma vida consagrada entregue totalmente a Deus na missão juvenil.

Vocações ao empenho apostólico
Linha de ação 9
Suscitar nos jovens o empenho apostólico pelo Reino de Deus com a paixão do da mihi animas cetera tolle e favorecer a sua formação.

Acompanhamento dos candidatos à vocação consagrada salesiana
Linha de ação 10
Fazer a proposta explícita da vida consagrada salesiana e promover novas formas de acompanhamento vocacional e de aspirantado.

As duas formas da vocação consagrada salesiana
Linha de ação 11
Promover a complementaridade e a especificidade das duas formas da única vocação salesiana e assumir um empenho renovado pela vocação do salesiano coadjutor.

Para o tema "Pobreza evangélica", deliberamos:

Linha de ação 12
Testemunho pessoal e comunitário
Dar testemunho crível e corajoso de pobreza evangélica, vivida pessoal e comunitariamente no espírito do cetera tolle.

Linha de ação 13
Solidariedade com os pobres
Desenvolver a cultura da solidariedade com os pobres no contexto local.

Linha de ação 14
Gestão responsável e solidária dos recursos
Gerir os recursos de modo responsável, transparente, coerente com os fins da missão, ativando as necessárias formas de controle em nível local, inspetorial e mundial.

Para o tema "Novas fronteiras", deliberamos:

Principal prioridade: os jovens pobres
Linha de ação (cf. linha de ação 13)
Fazer opções corajosas em favor dos jovens pobres e em situação de risco.

Outras prioridades: família, comunicação social, Europa
Linha de ação 16
Assumir uma atenção privilegiada pela família na pastoral juvenil; potencializar a presença educativa no mundo da mídia; relançar o carisma salesiano na Europa.

Novos modelos na gestão das obras
Linha de ação 17
Rever o modelo de gestão das obras para uma presença educativa e evangelizadora mais eficaz.

A referência às linhas de ação do CG26 neste discurso conclusivo tem a finalidade de reforçar a importância da sua acolhida e "inculturação" pelas Regiões e Inspetorias. Elas serão a "mensagem concreta" do CG26, que deverá ser estudada e traduzida, em nível pastoral, nos diversos contextos, a individualizar também critérios de verificação e elementos de avaliação.

Detenho-me sobre o "Projeto Europa".
Hoje, mais do que nunca, percebemos que a nossa presença na Europa deve ser repensada. O objetivo – como já dizia no discurso ao Santo Padre por ocasião da Audiência concedida aos membros do CG26 – "mira a redesenhar a presença salesiana com maior incisividade e eficácia neste continente. Ou seja, buscar uma nova proposta de evangelização para responder às carências espirituais e morais destes jovens que nos parecem um pouco peregrinos sem guias e sem meta".

Trata-se, então, de rejuvenescer com pessoal salesiano as Inspetorias mais carentes para tornar mais significativo e fecundo o carisma salesiano na Europa de hoje. Entendo esclarecer, portanto, que:
trata-se de um projeto de Congregação;
envolverá todas as Regiões e Inspetorias com o envio de pessoal;
para reforçar as comunidades, chamadas a serem interculturais e tornarem Dom Bosco presente entre os jovens, especialmente os mais pobres, abandonados e em situação de risco;
tudo será confiado à coordenação dos três Dicastérios para a Missão.

O projeto exigirá, obviamente, uma mudança estrutural nas comunidades do Velho Continente. "Vinho novo em odres novos". Não, portanto, uma obra de simples "manutenção de estruturas", mas um projeto novo para exprimir uma presença nova, ao lado dos jovens de hoje. Caminhamos com o coração de Dom Bosco, ricos da sua paixão por Deus e pelos jovens, para colaborar na construção social de uma Nova Europa, para que tenha realmente "uma alma", reencontre suas robustas raízes espirituais e culturais, para que, em nível social, dê espaço e paridade de oportunidades a propostas de educação e cultura, sem discriminações ou opções de exclusão social.

Entre as prioridades assinalo as mais importantes:
criar novas presenças para os jovens,
estimular iniciativas dinâmicas e inovadoras,
promover vocações.
Tudo isso deveria ajudar os Salesianos que trabalham neste contexto a alcançar uma mentalidade sempre mais européia, robustecer a sinergia entre as Inspetorias nos diversos setores e reforçar a colaboração em nível Regional.

4. A caminho do bicentenário do nascimento de Dom Bosco: a Congregação em estado de retorno a Dom Bosco para partir dele

O que Dom Bosco faria hoje? Não o sabemos! Mas sabemos o que fez ontem e, portanto, podemos saber o que fazer hoje para agir como ele. É questão de conhecimento e imitação.

Confirmamos neste Capítulo ser absolutamente indispensável contemplar Dom Bosco, amá-lo, conhecê-lo e imitá-lo, para descobrir as suas motivações mais profundas e estimulantes, aquelas nas quais buscava a energia que o fazia trabalhar incansavelmente pelos jovens; as suas convicções mais sólidas e pessoais, que o levavam a não voltar atrás; antes, que o tornavam fascinante e convincente; os seus objetivos definidos e claros, que o faziam ir adiante com uma só causa pela qual viver: ver felizes os jovens aqui e na eternidade.

Dom Bosco sentiu o drama de um povo que se afastava da fé e, sobretudo, sentiu o drama da juventude, predileta de Jesus, abandonada e traída em seus ideais e em suas aspirações pelos homens da política, da economia, quem sabe também da Igreja. Pergunto-me se não será esta situação, por tantos versos, semelhante àquela que identificamos em nosso Capítulo Geral.

Pois bem, diante dessa situação Dom Bosco reagiu energicamente, a encontrar formas novas de opor-se ao mal. Às forças negativas da sociedade, resistiu denunciando a ambigüidade e a periculosidade da situação, "contestando" – a seu modo, entende-se – os grandes poderes do seu tempo. Eis o que significa ter uma mente e um coração pastorais.

Sintonizado nessas carências, ele procurou dar uma resposta, com as possibilidades que lhe eram oferecidas pelas condições histórico-culturais e pelas conjunturas econômicas do momento histórico, e isso apesar de oposições parciais do mundo eclesiástico, de autoridades e fiéis. Fundou então oratórios, escolas de vários tipos, oficinas para aprendizes, jornais e revistas, tipografias e editoras, associações juvenis religiosas, culturais, recreativas, sociais; construiu igrejas, promoveu missões "ad gentes", atividades de assistência aos imigrantes; fundou duas congregações religiosas e uma associação laical que continuaram a sua obra.

Obteve sucesso, graças também, aos elevados dotes de comunicador nato, apesar da falta de recursos econômicos (sempre inadequados às suas realizações); da sua modesta bagagem cultural e intelectual (num momento em que havia necessidade de respostas de perfil elevado); do fato de ser filho de uma teologia e de uma concepção social com fortíssimos limites (e, portanto, inadequada para responder à secularização e às profundas revoluções sociais em ato). Impelido sempre por uma superior intrepidez de fé, em circunstâncias difíceis, pediu e obteve ajuda de todos, católicos e anticlericais, ricos e pobres, homens e mulheres do dinheiro e do poder, e expoentes da nobreza, da burguesia, do baixo e do alto clero.

Entretanto, a importância histórica de Dom Bosco, antes que nas muitíssimas "obras" e em certos elementos metodológicos relativamente originais – o famoso "Sistema Preventivo de Dom Bosco" – deve ser descoberta

na percepção intelectual e emotiva do problema da juventude "abandonada" com a sua importância moral e social;
na intuição da presença em Turim antes, na Itália e no mundo, depois, de uma forte sensibilidade, no civil e no "político", do problema da educação da juventude" e da sua compreensão por parte das camadas mais sensíveis da opinião pública;
na idéia que lançou de intervenções obrigatórias em larga escala no mundo católico e civil, como resposta necessária à vida da Igreja e à própria sobrevivência da ordem social;
e na capacidade de comunicar esta mesma idéia a largas fileiras de colaboradores, benfeitores e admiradores.

Nem político, nem sociólogo, nem sindicalista ante litteram, simplesmente padre-educador, Dom Bosco partiu da idéia que a educação podia fazer muito, em qualquer situação, se realizada com o máximo de boa vontade, trabalho e capacidade de adaptação. Trabalhou para mudar as consciências, para formá-las à honestidade humana, à lealdade cívica e política e, nesta perspectiva, procurou "mudar" a sociedade, através da educação.

Transformou os fortes valores nos quais acreditava – e que defendeu contra todos – em fatos sociais, em gestos concretos, sem dobrar-se ao espiritual e ao eclesiástico entendido como espaço ou experiência desobrigada dos problemas do mundo e da vida. Antes, forte da sua vocação de sacerdote educador, cultivou um esforço cotidiano que não era ausência de horizontes, mas dimensão encarnada do valor e do ideal; não era concha de proteção e recusa do confronto aberto, mas sincero medir-se com uma realidade muito ampla e diversificada; não era um mundo restrito a algumas poucas carências a satisfazer e lugar de repetição, quase mecânica, de atitudes tradicionais; não era recusa de qualquer tensão, do sacrifício exigente, do risco, da luta. Manteve para si e para os salesianos a liberdade e a altivez da autonomia. E não quis nem sequer ligar a sorte da sua obra à imprevisível alternância dos regimes políticos.

O conhecido teólogo francês Marie-Dominiue Chenu, O.P., ao responder nos anos oitenta do século passado à pergunta de um jornalista que pedia a indicação dos nomes de alguns santos portadores de uma mensagem de atualidade para os novos tempos, afirmou sem hesitar: "Agrada-me recordar, antes de tudo, aquele que antecedeu o Concílio de um século: Dom Bosco. Ele já é, profeticamente, um homem modelo de santidade pela sua obra, que é ruptura com o modo de pensar e crer de seus contemporâneos".
Foi modelo para muitos; não poucos imitaram seus exemplos e se tornaram, por sua vez, o "Dom Bosco de Bérgamo, de Bolonha, de Messina e assim por diante".

Obviamente cada um pode encontrar o "segredo" do seu "sucesso" numa das diversas facetas da sua complexa personalidade: empreendedor capacitadíssimo de obras educativas, organizador clarividente de empresas nacionais e internacionais, educador finíssimo, grande mestre, etc. Este o modelo que temos e somos chamados a reproduzir o mais fielmente possível!

5. Conclusão

Caros irmãos, vivemos o CG26 na estação litúrgica da Quaresma e no tempo de Páscoa. O Senhor convidou-nos assim a acolher a indicação da necessidade que temos de fazer experiência pascal, se quisermos chegar ao tão desejado renascimento espiritual e à renovação do nosso ímpeto apostólico. Não há vida sem morte. Não há a mística do "Da mihi animas" sem a ascética do "cetera tolle".

Gostaria de concluir a referir ainda uma experiência particular de Dom Bosco. No verão de 1846 ele adoece e vê-se em perigo de morte. Após algumas semanas supera o mal e, convalescente, só pode retornar ao Oratório apoiando-se num bastão. Os jovens ao percebê-lo obrigam-no a sentar-se numa poltrona, levantam-no e levam-no em triunfo até o pátio. Na capela, depois das orações de agradecimento, Dom Bosco profere as palavras mais solenes e custosas da sua existência: «Caros filhos, devo a vós a minha vida. Mas ficai certos disto: de agora em diante eu a gastarei toda por vós». Dom Bosco, inspirado pelo Espírito Santo, emitiu, em certo sentido, um voto inédito: o voto de amor apostólico, de entrega da própria vida pelos jovens, que observou em cada instante da sua existência. Eis o que significa o "Da mihi animas, cetera tolle", que foi lema inspirador do nosso Capítulo Geral. Eis o programa de futuro para o renascimento espiritual e para o ímpeto apostólico com que queremos chegar à celebração do bicentenário do seu nascimento.

Faço votos que nós e, conosco, todas as pessoas identificadas com os valores da Espiritualidade e do Sistema Educativo Salesiano, possamos amar os jovens e trabalhar como Dom Bosco na realização da missão salesiana. Espero que os jovens possam encontrar em cada um de nós (como os meninos do Oratório encontraram em Dom Bosco em Valdocco) pessoas disponíveis a caminhar com eles, a construir com eles e para eles uma presença educativa fascinante e significativa, capaz de proposta e de envolvimento, propositiva a ponto de produzir uma mudança cultural.

Um ícone que pode ilustrar perfeitamente este momento histórico da Congregação é o episódio da passagem do "manto e do espírito" de Elias a Eliseu, seu discípulo (2Re 2,1-15). Elias procura afastar Eliseu várias vezes, antes em Gálgala e, depois, em Betel e em Jericó, talvez pelo desejo de ficar sozinho no momento do seu desaparecimento. Mas Eliseu quer ser o seu principal herdeiro espiritual e fica ao seu lado. Como desejaria que cada um dos irmãos, diante de Dom Bosco, fizesse seu o desejo de Eliseu de receber dois terços do espírito de Elias. Feito herdeiro espiritual de Elias, Eliseu recolhe o seu manto e com este pousa sobre si também o espírito do mestre. Eliseu repete literalmente o último milagre de Elias e isso certifica os discípulos dos profetas que realmente "o espírito de Elias" pousou sobre Eliseu.

A esse propósito, vêm-me a mente as palavras de Paulo VI na beatificação do P. Rua, quando disse que aquela beatificação representava uma confirmação da sua qualidade de sucessor de Dom Bosco, de discípulo seu, da sua capacidade de ter acolhido e transmitido o espírito do Pai. Como o P. Rua, a fim de recolher a herança de Dom Bosco, permitamos que Deus, com a nossa total disponibilidade, aja em nós, como agiu nele.

Eis-me aqui, Caríssimos Irmãos, a entregar-lhes o fruto deste CG26, do qual os senhores foram protagonistas. Entrego-lhes um documento, sim, que será como a nossa carta de navegação para o sexênio 2008-2014, mas entrego-lhes, sobretudo o espírito do CG26. Ele quis ser uma intensa experiência pentecostal para uma profunda renovação da nossa vida e missão. Ele representa, pois, para todos os Salesianos, a plataforma de lançamento da Congregação a caminho do grande jubileu salesiano de 2015.

Que o Espírito possa soprar com força sobre a Congregação para ter a coragem de pedir ainda e sempre, com Dom Bosco: "Da mihi animas, cetera tolle",

Roma, 12 de abril de 2008

P. Pascual Chávez Villanueva
Reitor-Mor

trad.: jav

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