Homilia para o início do processo de discernimento
(para a eleição) do Reitor-Mor e dos membros do Conselho
Os apóstolos tinham deixado tudo para seguir a Jesus e o tinham acompanhado por cerca de dois anos. Morto Jesus, não havia mais nada a fazer a não ser voltar para casa, para o trabalho, para a pesca no lago da Galiléia. Jesus, porém, aparece-lhes precisamente agora. É como se a história começasse neste momento. É o que acontece na vida de cada um de nós e de nossos grupos. Cada dia é um novo dia e este recomeçar traz sempre consigo alegria, esperança e força para continuar a caminhada. Os apóstolos tinham encontrado Jesus três anos atrás às margens do lago como mestre desconhecido. Devem encontrá-lo agora como Jesus, como homem vencedor da morte.
Participar das eleições do Reitor-Mor e dos membros do Conselho Geral dos Salesianos quer dizer ser protagonistas de um momento importante para a Congregação e também para a Igreja; trata-se, sobretudo, de viver um novo encontro com Cristo ressuscitado que mantém viva a Congregação e que para ela quer uma caminhada renovada, tendo à frente alguns homens que confessam sua fé kerigmatica como Pedro na primeira leitura. Esta Eucaristia e estas jornadas de discernimento miram a reavivar a vossa fé, reforçar a vossa esperança e reanimar a vossa caridade. Elegereis, assim, homens animados pela graça pascal.
– Reavivar a fé significa neste caso fazer memória do fato de a Congregação salesiana ser obra do Pai (1Tm 3,15). Ele a quer, a protege e a guia. Ele, durante toda a sua história, a colocou nas mãos de homens de fé. Estes, mais que administrar uma instituição quiseram e souberam animar um carisma; todos eles, com estilo próprio, foram homens carismáticos; mantiveram viva a profecia. Nestes dias quereis eleger homens de fé, cheios de audácia e lucidez como Reitor-Mor e como conselheiros para esta nova etapa do Instituto. Alguém que recorde a fidelidade de Deus pelo Instituto e motive e alimente a fidelidade dos Salesianos ao Senhor e a este momento da história da humanidade e da Igreja. Há muitos desses homens na Congregação. Trata-se de eleger alguns e ter confiança em sua bondade e em sua coragem, e crer neles. Por isso, elegei-os entre os que crêem naquilo que anunciam, entre os que anunciam o que vivem e vivem do que crêem.
– Reforçar a esperança nestas jornadas significa para vós, recuperar serenidade e otimismo porque estais certos de que o Senhor foi e continuará a ser a cidadela da Obra salesiana no mundo. Significa confessar que dEle continuará a vos chegar a força para "caminhar humildemente no Senhor, amar com ternura e praticar a justiça" (Mq 6,8). Se Dom Bosco semeou alguma coisa, foi a esperança. Fortaleza, entusiasmo, mística, vigor e convicções profundas. Não lhe faltou o realismo da esperança. Ao dispor-vos, hoje, a eleger homens que vos conduzam com firmeza num mundo no qual falta muito a esperança, pensai naqueles que vivem na esperança porque atravessados pela graça pascal. Pensai naqueles que vos mostram a face da esperança e vos dão esperança; naqueles que vos fale de Jesus Cristo como boa nova, que vos torne firmes como irmãos, que faça de cada comunidade um farol que irradia esperança. Os jovens que são para vós o ar que respirais, buscam grupos que sejam animados por homens de esperança e tenham uma esperança viva porque precisam dela na maior parte das vezes.
– Reanimar a caridade. Hoje é um dia para agradecer ao Senhor pelo amor derramado no coração dos Salesianos no mundo todo e também para celebrar, aqui em Roma, no coração do Instituto, o amor do Instituto para com cada um de vós. Ele foi para vós mãe e pai. Fez-vos sofrer e também deleitar; graças a ele nascestes para a vida salesiana, ele vos ajudou a crescer, a formar-se, a purificar-se, a multiplicar-se… agradecei pois por este amor. Este amor levou-vos a fazer todo o possível para ter uma Congregação "sem mancha nem ruga" (Ef 5,25-27). Por amor à Igreja e à Congregação buscai agora uma equipe feita de homens que animem com ternura e se deixem amar, que sejam cheios de caridade pastoral. Só quem ama muito pode comandar bem; quando falta o amor exerce-se apenas um poder e notam-se muito bem os traços autoritários. Homens que põem amor lá onde não há amor; que o multiplicam onde já existe, e que sejam capazes de saber preferir entre todos os mais frágeis e sofredores da Congregação, os mais pobres e os excluídos. Orientai-vos na escolha de homens aos quais quereis muito bem e desejai-lhes as melhores coisas e, em concreto, neste momento, ser Reitor-Mor, Vigário ou Conselheiros.
Para os que forem eleitos, nós te pedimos, Senhor, fortaleza na fé, segurança na esperança e constância no amor.
Quero continuar agora a homilia contando-vos um sonho. De resto, Dom Bosco foi um grande sonhador e os sonhos geralmente têm um fundo teológico, ao menos para Jung. Não esqueçamos que os sonhos dos adultos são em branco e preto e, por isso, servem para aproximar-nos da realidade da vida de cada dia e, certamente, para fazer-nos rir um pouco, e disso temos necessidade visto que "ridens verum dire" (Horácio). As coisas mais profundas da nossa vida é preciso vivê-las e dizê-las com o sorriso nos lábios e, sobretudo no coração.
O sonho, eu o tive na noite passada. Sonhei mandar pelo correio eletrônico uma mensagem a Dom Bosco. Procurei o seu número no livro branco do céu. Vi com satisfação que Dom Bosco, sendo um Santo a quem agrada comunicar e comunicar-se, tinha um número próprio, o que não acontece com outros santos, por exemplo, com São Bruno. Há alguns Fundadores, como o bom S. Francisco de Assis que, por motivos de pobreza, compartilham o mesmo número com muitos outros santos. A mensagem que enviei a Dom Bosco foi esta:
"Roma, 23 de março de 2008. Caro Dom Bosco. Pela segunda vez coloco-me em comunicação contigo; faço-o porquê, embora me aconteça raramente, hoje não consigo conciliar o sono. Sou uma marianista que nestes dias está vivendo com os teus filhos a experiência do seu 26º Capítulo Geral. Estamos a começar o período das eleições e como podes imaginar gostaria de já saber quem será o Reitor-Mor e aqueles que o acompanharão como conselheiros no próximo período. Não te peço que me digas os nomes; mas, ao menos, coloca-me no caminho: diz-me alguma coisa do seu perfil, a idade do Reitor-Mor, a sua língua materna, o trabalho que faz, o esporte que pratica, a sua oração preferida… sobre o seu nome, é suficiente que me indiques a primeira e a última letra… quanto ao mais, eu mesmo me encarrego. Agradeço antecipadamente pelo teu serviço, e perdoa o meu atrevimento".
Duvidada poder receber uma resposta. Mas hoje, pelas seis horas, iniciei o computador, entrei na Internet e encontrei uma mensagem escrita com letras grandes e em italiano: era a resposta.
"Caro P. José Maria. Obrigado por ser salesiano de coração sem deixar de ser um bom marianista. Compreendo a tua curiosidade sobre quem será o Reitor-Mor e sobre a lista dos conselheiros. Posso-te garantir que serão bons salesianos. Quando forem eleitos dá-lhes um abraço em meu nome. Aqui no céu há muito interesse pelo tema. São vários os santos e as santas que rezam para que meus filhos elejam as pessoas que neste momento o Instituto merece e das quais precisa. O próprio Espírito Santo, que é sábio, prometeu estar com eles e entre eles neste tempo de eleições e disse esperar que percebam que Ele é como o vento que sopra onde quer. Recorda-lhes que não é conveniente sentir-se muito seguros de si, caso contrário começarão a construir outra Babel… Fiquem à espera e sempre abertos. Justamente ontem reuni-me com Domingos Sávio, Madre Maria Mazzarello e Maria Auxiliadora. Esta estava preocupada por saber se os Salesianos terão vinho suficiente e de boa qualidade para celebrar a eleição do Reitor-Mor e dos membros do Conselho. Um Frascati qualquer não serve para uma festa tão grande. Ela não está muito preocupada com as eleições em si. São assim as mães. Preocupa-a o que vem depois… A eleição do novo Conselho Geral deve ser uma festa e exercerei todas as minhas influências de fundador para pôr nos Capitulares um pouco de calor humano e naqueles que forem eleitos muita humildade no coração e na mente para transmitirem o espírito salesiano pela presença e pelo contágio, sem muitos papéis.
Quanto ao mais, devo dizer-te que não quisemos que se façam campanhas, mas usamos de todas as nossas influências para que elejam como Reitor-Mor sobretudo um salesiano que ofereça três coisas: forte motivação para viver o carisma salesiano, grande visão para ir à frente como quem vê o invisível e direção, isto é, que ajude a ter um rumo.
– A motivação é importante num grupo e em nossos dias. Significa dar sentido, criar entusiasmo, dar razões, reviver o credo salesiano… Durante a minha vida terrena eu transmiti muito dessas coisas, e mais ainda do céu. Aqui no céu, o Pai, o ABBÀ, mantém-nos a todos muito motivados e isso é muito bom para nós… Os franceses chamam este espírito de "punch", os americanos de "input", os espanhóis de "ilusión", os italianos de "forza" e, com o Evangelho nas mãos, podemos chamá-lo de vida eterna e paixão pelo Reino.
– Um Instituto religioso como o Salesiano precisa de visão; precisa de alguém que desperte e mantenha constantemente vivos os grandes desejos e as grandes paixões, o sentido de santidade, o desejo forte de conversão e uma grande qualidade de vida; que reavive o sonho da América e não esqueça o sonho da Ásia, o sonho da qualidade na educação, de viver o carisma e a missão com os leigos, o sonho da paixão pelos jovens… O Reitor-Mor não se dedicará a apagar fogo, mas ao contrário, a multiplicar e alimentar o fogo que eu pus na terra, sentando-se ao seu redor com os Salesianos e reavivando-o com boa lenha. O grupo que não tiver um líder que enxergue longe e o mais claramente possível, não poderá subsistir… Por isso, é bom que veja com os olhos do Papa e dos jovens, dos pobres e dos leigos… e que veja mais além de 2010 e não olhe para trás mais do que o conveniente.
– Não pode faltar uma direção. O Reitor-Mor dirige, conduz, governa… evita que se fique a girar em círculo, sem caminhar para parte alguma. Indica o norte e acompanha no caminho para chegar a tempo. Deverá saber oferecer os odres adequados para versar o vinho novo e ter a arte de chegar a resultados concretos; não lhe pode faltar o gosto pela cotidianidade e pela simplicidade.
S. Francisco de Sales participou bem ativamente da nossa reunião. E o fez com muita liberdade; teria sido interessante se o tivesses podido ouvir diretamente. Sugeriu algumas coisas ao Reitor-Mor que será eleito: cada conselho dado proceda de um coração que conhece intimamente o Pai porque só assim poderá ser flexível sem cair no relativismo e firme sem ser rígido. Sugere ainda que evite a tentação de querer converter pedras em pão na vida salesiana, mas não deixe de se apegar à sua missão de proclamar a Palavra, desde o momento que aquilo que de mais precisam os Salesianos são as palavras que saem da boca de Deus e entram em suas vidas. Que evite "lançar-se do pináculo do templo a espera de anjos que o sustentem", isto é, não caia na tentação de trabalhar só quando quer fazer alguma coisa importante. Que evite, enfim, a tentação de só pretender guiar, dirigir e falar, mas aceite com simplicidade ser guiado, conduzido, e, sobretudo escute aqueles que pensam poder-lhe ensinar pouco.
Talvez me digas que te deixei como antes; que te disse muito e não te disse nada. José Maria, eu não quis fazer-te nenhum prognóstico. As coisas são mais sérias do que parecem e, se quiseres, mais simples do que alguns as fazem. Neste, como em muitos outros aspectos da Igreja, os que sabem não falam e os que falam não sabem. A verdade, porém, é que eu não sei muito mais; nutro alguns desejos e sonhos, e espero que se cumpram. São eles, os meus filhos, os que votam: tudo está em suas mãos. De qualquer modo, diz-lhes que não se esqueçam que com a nossa ajuda escreverão direito, embora de algum modo as linhas estejam tortas.
Obrigado por acompanhar este processo. Devo dizer ainda que no último momento da reunião apareceu Jesus. Confidenciou-nos que já fez uma pergunta ao Reitor-Mor que será eleito: Amas-me? E ele respondeu que sim, e se o lê em seu rosto; e, naturalmente, sugeriu-lhe agir sempre em seu nome. Por já ter aceitado em seu coração, Ele lhe dará como presente uma boa dose de criatividade misturada com fidelidade e, por isso, fará que uma coisa e outra sejam ancoradas no amor por Ele. Isso é tudo que podes e deves saber e, agora, reza e espera como todos. Dom Bosco".
Tentei imprimir este texto, mas foi impossível. As palavras que chegam do céu só se imprimem no coração. Confio que algumas destas palavras, duas ou três, não mais, fiquem no coração daquele que for eleito Reitor-Mor e no coração daqueles que o acompanharão como membros do Conselho. O último conselho refere-se à humildade e à verdade e nasce de mim mesmo. Não se esqueça o Reitor-Mor que não se elegem os melhores para estas incumbências; elegem-se aqueles que sabem alegrar-se no serviço aos outros; aqueles que já aprenderam a dar a própria vida pela salvação de muitos e, ao mesmo tempo, sabem conciliar bem o sono durante a noite porque confiam a Congregação a cuidados melhores, aos do Senhor e aos de Maria.
Desçamos à realidade. Continuemos a nossa celebração, confiando ao Pai o trabalho desta semana: discernir para eleger, eleger para governar bem o Instituto e governar para servir.