* O texto que segue foi construído pelo P. José Ivanildo, com recortes de livre tradução, da exposição feita em espanhol pelo P. Juan Botasso.
O segundo dia do Encontro Pan-Amazônico salesiano contou com exposição do P. Juan Botasso. Salesiano Missionário e professor na Universidade Católica de Quito, dedicou o melhor de suas energias para a pesquisa do povo Shuar. Escreveu uma coleção chamada “Mundo Shuar”, “Los Salesianos y la amazonía” e tantos outros escritos sobre mitos e história.
CONTEXTO HISTÓRICO
O contexto histórico da América do Sul no final do século XIX, assim como tantos outros continentes, estava marcada por preocupantes situações, especialmente a questão dos imigrantes Italianos que fugiram dos conflitos na Europa e necessitavam de atendimento sócio-espiritual.
Na Argentina fora oferecida aos salesianos a possibilidade de “atender os imigrantes e evangelizar os pagãos. Dom Bosco, entretanto, tinha maior interesse pelos povos da Patagônia e Terra do Fogo. “Sus salesianos pudieron entrar a Patagonia em el momento exacto em que ele ejército argentino llevaba a cabo uma guerra de conquista y extermínio contra los Mapuche”.
O trabalho missionário na Patagônia foi bastante frutífero, não obstante as dificuldades. Isto abriu caminho para a presença salesiana entre os povos Amazônicos. Nesse caminho de aproximação figuras como a de Dom Lasanha, P. Bálzola e P. Malan, figuram como pioneiros.
OS SALESIANOS E OS INDÍGENAS
Os salesianos desde sua chegada na América não se destinaram preferencialmente aos povos indígenas. Somente uma pequena parcela foi trabalhar diretamente com eles. O desenvolvimento da presença salesiana na América foi essencialmente urbana. Os bispos pediam os salesianos para cuidar da educação e para dar visibilidade a Igreja, marginalizada por governos liberais.
Por outro lado, havia ainda o agravante da mentalidade de salvação e evangelização ligada exclusivamente ao sacramento do batismo. Já estando batizados os indígenas não corriam perigo de perder-se, portanto, não parecia urgente cuidar deles. Somente nas últimas décadas do século XX, motivados pelo Concílio Vaticano II e as Conferencias Latinas, que proclamaram a opção preferencial pelos pobres, os salesianos tomaram a consciência de que os povos indígenas eram um agrupamento necessitado de acompanhamento e assistência.
A TEOLOGIA DOS MISSIONÁRIOS SALESIANOS
Os salesianos, seguindo a mentalidade de seu tempo, buscavam “Salvar almas”, o que significava na prática administrar o batismo ao máximo de pessoas possíveis. Essa interpretação restritiva dos padres da Igreja dos primeiros séculos, resumida na frase – “fora da Igreja não há salvação”, fez a pratica missionária limitar-se a implantação da Igreja e o anuncio do Evangelho, mesmo que isso tivesse que significar ignorar os demais aspectos da vida dos povos evangelizados.
O Evangelho, comparado a uma semeadura de trigo, era uma força a sobrepor-se ao pensamento religioso dos povos. Evidente que isto contradiz a visão que temos da religião como núcleo mais íntimo e forte de uma cultura. “Si se la destruye, ¿cuál surte correrá la cultura?”.
A ANTROPOLOGIA DOS MISSIONÁRIOS
Que visão tinham da cultura e dos povos a que eram enviados? A que era comum a todos os povos do mundo ocidental e, a maioria, estava de acordo de que os povos indígenas ainda não haviam alcançado o seu pleno desenvolvimento humano e intelectual. Estavam sem uso da razão, portanto, impedido de progredir. “Ningún misioner compartió nunca esta vision. Todos estaban convencidos que con una paciente labor educativa y el anuncio de la religión verdadeira, llegarían a ‘civilizar-se’ ”.
A PREPARAÇÃO PARA IR AS MISSÕES
Os salesianos que iam para missão recebiam uma formação igual a de todos os demais religiosos, isto é, certa base filosófica, teológica, espiritual e de piedade, treinamento para uma vida sóbria, além disto, nada de específico. No próprio lugar de trabalho cada um buscou mover-se guiado pela experiência adquirida em sua terra e por intuição. A maioria se empenhou desde muito jovem nessas tarefas, o que facilitou a inserção e formação de mentalidade, aprendizagem da língua e cultura do país de destino.
Quase todos os salesianos que produziram pesquisa nas áreas de antropologia, linguística, etnografia, etc, foram autodidatas e empreenderam suas iniciativas movidas por entusiasmo pessoal. Talvez se tivesse ido as universidades tivesse tão somente absorvido os objetivos nacionalistas dos países em que estavam.
OS MÉTODOS DE EVANGELIZAÇÃO
Na maioria das missões amazônicas o método mais utilizado para a evangelização foi a do internato. No Equador, Rio Negro, e no Alto Rio Orinoco, com diferentes etnias, assim se procedeu. Com os Xavantes e Bororo no Mato Grosso a prática foi diferente.
Os principais motivos para a criação dos internatos podemos resumir nos seguintes itens: próprio da mentalidade salesiana partir da educação das crianças e adolescentes para converter ao cristianismo e promover o bem; a possibilidade de concentrar em um lugar central diferentes povos de disperso território; separação do ambiente familiar indígena, considerado “selvagem” e pouco educativo.
Este sistema gerou resultados muito controversos, severas críticas e denúncias, vindo pôr fim a terminar.
ANTROPOLOGOS E MISSÃO SALESIANA
As relações entre os antropólogos e os missionários salesianos variaram bastante de lugar para lugar, mas de modo geral, houve desconfianças e mútuas críticas. Os antropólogos viam os missionários como “fanáticos” religiosos que buscavam mudar a cultura dos povos. Os missionários viam os antropólogos como estudiosos descomprometidos, preocupados em escrever livros com fins acadêmicos e nada mais.
A MUDANÇA
Nas últimas décadas do século XX a orientação para o trabalho dos missionários conheceu uma mudança radial. No centro desta revolução está o Concílio Vaticano II com uma série de outras mudanças e descobertas no campo cultural, antropológico e teológico.
Esforços como o de traduzir as Sagradas Escrituras em línguas indígenas, a criação de movimentos sociais e ONG`s, o contato frutuoso com antropólogos, o desenvolvimento de práticas educativas inculturadas ajudaram a resgatar valores culturais importantes de diferentes povos, promovendo assim líderes e comunidades capazes de participar de forma ativa de sua própria história.