Neste segundo nível do estudo de docência em salesianidade no Centro Regional de Quito/Equador, estamos aprofundando a complexa temática da fundação do oratório. É comum imaginar que a formação do oratório foi apenas uma espécie de efeito de algumas situações que Dom Bosco presenciou em Turim, mas existem outras realidades que gostaria de desenvolver neste breve artigo em três constatações: 1. A experiência do Convitto, 2. O oratório no Refugio, 3. A institucionalização do oratório.
1. A experiência do Convitto: Quando Dom Bosco chegou ao Convitto Eclesiástico em 1841 a convite do Pe. Cafasso, ele encontrou uma atividade que os padres faziam naquela casa de formação. Era um pequeno oratório para meninos pobres que vinham comer alguma coisa e também participar da catequese. Foi ali que o recém ordenado padre João Bosco, aos 26 anos, começou a fazer uma experiência que será vital para toda a sua vida. Na verdade o ambiente de Turim em pleno desenvolvimento urbano era um desafio para João. Ele foi criado nos campos, na zona rural dos Becchi, depois passou a Chieri, que era uma cidade de porte médio, mas em Turim as coisas eram diferentes. Tratava-se de uma cidade urbana cheia de problemas, sobretudo a miséria devido ao êxodo rural de meninos e meninas que corriam atrás de uma vida melhor. Por baixo desta urbanização estava também sendo plantado uma revolução política liberal e social de grandes proporções que terá seu ponto culminante no ano de 1848 com o Estado liberal. Ao sair do Convitto ele levou consigo para o Refúgio da Marquesa de Barolo um grupo de meninos, era o berço do futuro oratório de Valdocco.
2. O oratório no Refugio: A Marquesa de Barolo desde 1822 tinha organizado na periferia de Turim uma casa de acolhida e um oratório para meninas de rua e mulheres que saiam das prisões. Portanto, quando Dom Bosco conheceu a Marquesa em 1841, ela estava inserida no apostolado de recuperação de mulheres abandonadas e excluídas da sociedade. Como capelão do pequeno hospital que ela estava construindo chamado de Santa Filomena, Dom Bosco conseguiu um pequeno espaço para reunir os meninos. Ao mesmo tempo em que atendia as meninas, pregava retiros espirituais, percorria as prisões e visita outros hospitais, ele também tinha tempo para estar com aqueles meninos excluídos. Naquele espaço do hospital em construção ele organizou o oratório e uma capela, e deu o nome de São Francisco de Sales. Evidentemente que o oratório não era o único na cidade, mas ali tinha algo de novidade. Mais do que impor um ritmo de vida aos meninos já reprimidos, Dom Bosco colhia os desejos dos mesmos e proporcionava a eles o crescimento em suas manifestações juvenis: correr, cantar, rezar, fazer amigos, jogar, etc. Aqui está uma coisa muito própria do oratório salesiano, ou seja, gostar daquilo que os jovens gostam. É aquele misterioso toque da receita que somente quem entendeu Dom Bosco é capaz de fazer. O ambiente oratoriano era uma “aldeia aberta”, uma realidade cosmopolita, na qual entravam todos os jovens de todas as regiões da Itália que chegavam a Turim. Um centro cultural com ambientes de todos os tipos: oficinas, escolas, teatro, escola de canto, atendimento medico, etc. Quando estudo os inícios de algumas obras na inspetoria, como por exemplo, a Sacramenta, o Pró-Menor, o atual Centro de Manicoré, para mencionar alguns, os vejo como esta cidade querida por Dom Bosco. Todas as necessidades básicas dos jovens eram atendidas dentro do ambiente. Trata-se de uma verdadeira casa, paróquia, família. Contudo, às vezes nossas obras perdem esta originalidade. A pesada estrutura com uma grande folha de pagamento e muita burocracia, amarram a leveza do carisma, matam os carismas pessoais e bloqueiam o dinamismo urbano do projeto e se tornam meros centros mais preocupados com o econômico do que com a promoção humana e cristã dos jovens.
3. A institucionalização do oratório: Depois do período de três anos com o oratório migrante, uma verdadeira experiência de êxodo, na tentativa de conseguir um espaço mais amplo que pudesse acolher mais jovens do que aquele da Marquesa, Dom Bosco chega em Valdocco, a terra prometida nos seus sonhos. Interessante é que ele rodou com os meninos ao redor de Valdoco muitas vezes porque tudo é muito perto, mas somente quando recebe a proposta do Pancrácio Suave é que ele descobre a velha casa dos Pinardi e ali, sem dinheiro, começa a organizar o oratório que continuará com o nome de São Francisco de Sales. É neste momento, 1846, que começa a institucionalização do oratório. Compreendamos que Dom Bosco não queria uma organização que matasse a força do carisma, porque o carisma é livre, flexível, criativo. Isto ele não queria. Na mente dele existia um projeto de futuro para o oratório, portanto, era necessário um espaço e algumas normas que respeitasse o desejo dos jovens mais pobres e ao mesmo tempo fosse uma evangelização que formasse para a vida. Aos poucos surgem as oficinas, a casa anexa para os meninos sem moradia em Turim, a escola noturna, etc, até criar o colégio. Uma questão que surge quando nasce o colégio é a seguinte: Até que ponto o colégio deixou de ser oratório? Se pensamos que oratório é uma estrutura, então, ele se transformou num apêndice, agora, se o oratório na mente de Dom Bosco era um espaço de encontro e de proposta de evangelização, o colégio é também oratório. Contudo, o que temos hoje de fato? Nossos colégios vivem a experiência vital do oratório ou melhor ainda, a casa salesiana é um oratório? Como as novas gerações de salesianos entendem o oratório?
No inicio do CG 26 o padre Pascual Chávez disse uma frase muito importante aos capitulares e a todos nós, é a seguinte: “O nosso DNA é o mesmo do nosso Pai Dom Bosco”. Tendo em conta que o DNA define toda a estrutura de uma pessoa e é único; dizer que somos o mesmo DNA do fundador tem um peso muito grande. Isto para mim significa que estamos comprometidos até as cinzas com o projeto fundacional que, na vida do fundador, foi fruto de uma experiência de vida, desde suas origens, e não uma mera causalidade. Ser salesiano, portanto, é muito mais que pertencer a esta Instituição que nos acolhe, é ser a expressão mais viva de Dom Bosco em nosso tempo. Creio que é desde aqui que vale a pena fazer um grande exame de consciência sobre a nossa fidelidade criativa e carismática, tendo como elemento motivacional o oratório, tendo em vista a missão de formação de discípulos e missionários que Aparecida nos chama urgentemente a realizar.