ENREDO PARA O CARNAVAL 2012
UM MENINO, UM SONHO, UMA OBRA: O AMOR DE DOM BOSCO VIROU REALIDADE
AUTORES
Ivan de Oliveira, Neilo Batista e Osmir Medeiros
APRESENTAÇÃO
A Escola de Samba Reino Unido da Liberdade propõe-se, com o enredo escolhido para o desfile carnavalesco de 2012, um dos maiores desafios dos seus 30 anos de história: homenagear Dom Bosco e o maravilhoso resultado da luta de toda sua vida, a Família Salesiana, que hoje se espalha por mais de 130 países nos cinco continentes.
Carnaval e Igreja Católica podem até não ter uma ligação direta, é bem verdade, mas ao se estudar a vida e a obra de Dom Bosco notam-se vários paralelos com a Reino Unido da Liberdade, dos quais o mais importante é o fato de que tanto a Família Salesiana quanto a nossa Escola de Samba nasceram de sonhos de adolescentes humildes preocupados em construir um mundo melhor especialmente para a juventude carente, tendo a arte e a música como elementos vitais nesse processo.
Assim, a Reino Unido da Liberdade acredita ter o necessário conhecimento de causa para falar de Dom Bosco e da Família Salesiana, porque foi o trabalho de inclusão social por meio da arte, do entretenimento, da educação e da retidão de caráter que levou a obra salesiana a se espalhar pelo mundo e a chegar, há praticamente um século, na capital amazonense.
Santo dos jovens e dos oprimidos, Dom Bosco costumava dizer que “o que somos é presente de Deus; no que nos transformamos é o nosso presente a Ele”. E nós, da Reino Unido da Liberdade, esperamos poder traduzir o presente de Dom Bosco ao Criador em um espetáculo carnavalesco pleno de arte, emoção e muito amor.
SINOPSE DO ENREDO
Dom Bosco nasceu Giovanni Melchior Bosco a 16 de agosto de 1815, num lugarejo pobre chamado Becchi, na região do Piemonte, na Itália. De família humilde, de camponeses, ficou órfão de pai aos dois anos de idade, enfrentando muitas dificuldades na infância e na mocidade, mas sem jamais desistir dos estudos ou do ideal de ajudar o próximo. Sempre foi um menino sonhador e bastante religioso, que gostava de falar sobre Deus aos coleguinhas e ficava muito irritado com eles, que só queriam saber de brincadeiras. E, dos muitos sonhos que teve, um, sonhado aos nove anos de idade, marcou sua vida em definitivo. Nesse sonho, João Bosco vê-se indignado com uma multidão de meninos que se comportam de forma grotesca e até com blasfêmias, e parte para enfrentá-los. É quando lhe surge um homem, de aspecto venerando, que lhe diz: “Com pancadas não, João, mas com mansidão e amor deverás ganhar o coração desses teus amigos”. A partir daí, a multidão de meninos se transforma primeiramente em bando de animais indóceis (cães, lobos, cabritos, ursos etc), depois transformando-se em mansos cordeiros.
Quando compreende o significado do sonho, de que precisaria usar do amor e da cordialidade para conquistar os corações das crianças, adolescentes e jovens para Deus, João Bosco se aprimora nas artes circenses (pelas quais era apaixonado) e passa a usá-las como atrativo para chamar a atenção dos colegas e pregar-lhes a palavra de Deus. É assim que ele atua como equilibrista, malabarista e mágico, tudo para melhor evangelizar. Em nome do amor, torna-se um talentoso artista circense, tanto que é considerado o Padroeiro dos Mágicos.
A síntese, daí para diante, é que Dom Bosco sai de casa, vai para um seminário, ordena-se padre aos 20 anos de idade, recusa comodidades de paróquias abastadas e resolve seguir a outro padre, José Cafasso (hoje São José Cafasso), em um trabalho religioso junto a jovens condenados e cumprindo pena em presídios, experiência que lhe faz compreender o quanto os jovens pobres daquela época eram desvalidos e explorados pelos patrões, sendo obrigados a longas jornadas de trabalho em condições precaríssimas e por salários aviltados.
Consciente de sua missão, João Bosco parte em peregrinações para ajudar os jovens necessitados, jornada na qual vai arrebanhando seguidores, entre os quais Bartolomeu Garelli, Carlos Buzetti, Miguel Rua e Domingos Sávio (hoje São Domingos Sávio), iniciando com esses o primeiro dos inúmeros oratórios que se transformariam na base do trabalho de evangelização, educação e formação profissional desse santo. Os oratórios salesianos são, por excelência, lugares alegres, impregnados de arte e atividades de entretenimento, pois, para Dom Bosco, “um oratório sem música é um corpo sem alma. E a ginástica, a música, os passeios e o teatro são meios eficazes para a educação da juventude.”
Depois de voltar à casa materna por um período, para se recuperar de uma pneumonia, João Bosco retorna ao oratório e já leva consigo a mãe, Margarida, para ajudar em sua obra. No oratório, além de um lugar para morar, estudar e conhecer o evangelho, os jovens também eram preparados profissionalmente, aprendendo artes e ofícios como os de sapateiro, alfaiate, encadernador, tipógrafo, carpinteiro e ferreiro.
É com a tenacidade de seu trabalho que João Bosco quebra resistências dentro da própria Igreja Católica, ganha o respeito e admiração do papa e consegue, finalmente, fundar a Sociedade de São Francisco de Sales, hoje mundialmente conhecida como Congregação dos Salesianos. E, tempos depois, funda junto com madre Maria Mazzarello a Congregação das Irmãs Salesianas, para cuidar das jovens necessitadas. A essas duas instituições foram se agregando outras, ao longo dos tempos, compondo atualmente um gigantesco conglomerado de organizações sob a marca da Família Salesiana. Em Manaus, por exemplo, fazem parte dessa família o Colégio Dom Bosco, as Faculdades Dom Bosco, o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, o Patronato Santa Terezinha, o Colégio Madre Maria Mazzarello, a Casa Mamãe Margarida e o Pró-Menor Dom Bosco.
Movido sempre por seus sonhos João Bosco vislumbra, numa visão onírica que ficou conhecida como “O sonho de Santiago a Pequim”, a presença dos salesianos pelos quatro cantos da Terra, encorajando-se a enviar grupos de religiosos mundo afora. Foi a partir daí que os “Dom Boscos do Amanhã”, como ele costumava chamar seus missionários, passaram a “desbravar” outros países, chegando à Tânzania, Zimbábue, Suazilândia, Quênia, Etiópia e outras nações africanas; à Índia, Sri Lanka, Nepal, Camboja, Vietnã e China no continente asiático, a toda a Europa e, por fim, na América do Sul. Mais um sonho se materializa, mais uma parte da obra que se concretiza.
A chegada dos salesianos na América Latina deu-se pela Patagônia, na Argentina, em missão liderada pelo padre João Cagliero, um dos meninos do primeiro oratório. Nessa turma, que partiu da Itália em 1875, estavam 10 missionários que receberam de Dom Bosco, junto com o crucifixo em gesto simbólico, a tarefa de espalhar a obra salesiana pelos países do Cone Sul.
No Brasil, a primeira casa salesiana foi o Colégio Salesiano Santa Rosa, em Niterói, no Rio de Janeiro, fundado em 1883, com grande incentivo do Cônego Brito.
Mas um fato marcante que relaciona firmemente Dom Bosco ao Brasil – embora ele nunca tenha vindo ao País – foi outro sonho do santo, a 30 de agosto de 1883, no qual, como muitos acreditam, ele anteviu a fundação de Brasília. Nesse sonho, ao empreender uma grande viagem pela América Latina, Dom Bosco viu o Planalto Central e, entre os paralelos de 15º e 20º, uma depressão bastante larga e comprida, partindo de um ponto onde se formava um lago. Então, repetidamente, uma voz assim lhe falou: “…quando vierem escavar as minas ocultas, no meio destas montanhas, surgirá aqui a terra prometida, vertendo leite e mel. Será uma riqueza inconcebível…" A 31/12/56, antes mesmo do início da construção do Plano Piloto, ficou pronta a Ermida Dom Bosco, às margens do Lago Paranoá, exatamente na passagem do paralelo de 15º.
Uma vez no Brasil, os salesianos seguem para Amazônia a pedido dos bispos de Belém e de Manaus, que descrevem ao Vaticano a necessidade de assistência material, moral e religiosa em alguns municípios do Amazonas. Foi criada então, a Prefeitura Apostólica do Rio Negro, localizada, segundo cronistas da época, em um território “quase totalmente abandonado”, que a Congregação Salesiana foi encarregada de dirigir.
A cristianização dos índios era uma das grandes preocupações do Papa Pio IX e do próprio Dom Bosco, que viabilizou a presença salesiana na Amazônia, oficializada a 18 de junho 1914, graças a atuação de Dom Frederico Costa, bispo de Manaus, que se empenhou para que as Missões do Rio Negro fossem confiadas à Congregação Salesiana. Naqueles tempos difíceis, os salesianos encontraram muitos indígenas explorados por donos de seringais, enfrentaram dificuldades de locomoção e doenças tropicais, mas não desistiram e fundaram várias missões, como as de Iauareté, Içana, Marauiá, Maturacá, Pari-Cachoeira, São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel e Taraquá, todas no Alto Rio Negro, além do Internato Salesiano de Barcelos.
Portanto, especialmente com seu trabalho educacional e de formação profissional, os salesianos exerceram um papel importantíssimo no desenvolvimento da Amazônia.
O dia 24 de julho de 1921 foi um marco histórico para a cidade de Manaus. Chegaram, nesse dia, os primeiros salesianos à capital amazonense, convidados pelo bispo Dom Irineu Joffely, com o objetivo de fundar a primeira escola salesiana da região Norte. No grupo estavam, entre outros, os padres Ghislandi e Agostinho Caballero Martins, que foram os fundadores daquele que é hoje uma das maiores instituições educacionais da região, o Colégio Dom Bosco, erguido em decorrência das necessidades apontadas por Dom Irineu, visto que Manaus enfrentava muitos problemas sociais, políticos e culturais, além de passar por uma grande crise financeira devido a quebra do monopólio da borracha.
O Colégio Dom Bosco foi erguido na Avenida Epaminondas com ajuda de alguns comerciantes locais. Funcionou, em seus primeiros anos, com aulas diurnas para os filhos de famílias abastadas e noturnas para os filhos de operários. O ensino era avançado, enaltecendo as leituras interpretativas. O colégio contava ainda com o Oratório Festivo, prática mundial das obras salesianas, animado por partidas de futebol, competições de atletismo, sessões de cinema e outras atividades de lazer.
Marco das obras salesianas em Manaus, pois é a primeira instituição fundada pela congregação na cidade, o Colégio Dom Bosco completa, em 2011, nada menos que 90 anos de excelentes serviços à sociedade amazonense, tendo formado grandes cidadãos que, atuando na medicina, política, direito, engenharia e inúmeras outras áreas, contribuíram e vêm contribuindo para o crescimento e desenvolvimento do Estado.
Hoje, além do colégio, já existe a Faculdade Salesiana Dom Bosco, única instituição de ensino superior da cidade certificada com atestado de responsabilidade ambiental e com o selo de neutralização de carbono.
EPÍLOGO
Eis porque, no carnaval de 2012, a Escola de Samba Reino Unido da Liberdade tem a imensa honra de exaltar este grande sonhador e mentor de tão importantes obras para o bem da humanidade. O sonho e a obra de Dom Bosco, exemplificados nos 90 anos de existência do Colégio Dom Bosco de Manaus, serão os grandes alicerces para um magnífico e grandioso desfile carnavalesco, em que a emoção e o reconhecimento do valor humano tomarão conta de todos os corações daqueles que estiverem na avenida ou em qualquer outro lugar do mundo, porque o espírito de quem quer fazer o bem não encontrará barreiras jamais.
E seguindo a legenda Omnia vincit labor (Com o trabalho em verdade tudo vence) que se encontra na entrada do colégio Dom Bosco, a Escola de Samba Reino Unido da Liberdade pede as bênçãos de São João Bosco, o grande homenageado, para ir à luta e defender mais um título do grupo especial do carnaval amazonense.
GLOSSÁRIO
Blasfêmia – Palavra que ultraja a divindade, insulta a religião.
Desvalido – Desprotegido, desamparado, sem apoio.
Ermida – Pequena igreja, capela, quase sempre edificada em lugar ermo.
Congregação – Confraria formada por pessoas piedosas, sob invocação de um santo. Instituição religiosa.
Onírica – Relativa aos sonhos.
Oratório Festivo – Local para acolhimento, educação profissional e orientação religiosa de jovens concebido por Dom Bosco.
Salesiano – Denominação dada a padres, freiras e membros leigos da Congregação de São Francisco de Sales, fundada por Dom Bosco.
Venerando – Digno de respeito, respeitável, venerável.