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DECLARAÇÃO: FRATERNIDADE E AMAZÔNIA

Segue, na íntegra, a Declaração “Fraternidade e Amazônia: vida e missão neste chão”, aprovada hoje, durante a 45ª Assembléia Geral da CNBB.


D E C L A R A Ç Ã O


FRATERNIDADE E AMAZÔNIA
VIDA E MISSÃO NESTE CHÃO



A Amazônia, nestes últimos anos, tem despertado muito interesse em todas as partes do mundo, pois além de suas riquezas naturais, da sua sócio-biodiversidade, por ser um dos maiores reservatórios de água doce do mundo, existe uma grande preocupação com a preservação e o cuidado desses tesouros de dimensões planetárias.



A Igreja não poderia ficar de fora do debate que essas preocupações provocam, pois ali também está o maior tesouro, foco principal das preocupações pastorais da Igreja, que é o amazônida, na sua diversidade sócio-cultural e religiosa.



O episcopado brasileiro, reunido em Assembléia, em Itaici, por sua missão evangelizadora, tem os olhos voltados para a Amazônia, acompanhando os passos que a Igreja vem dando na região há muito tempo, sobretudo nos últimos anos, em que ela se sente desafiada pelas contínuas investidas contra a obra do Criador naquela região e pelas agressões à dignidade e aos direitos humanos de tantos filhos e filhas de Deus.



Há muito tempo os bispos dos regionais existentes na Amazônia expressam nas múltiplas iniciativas comuns e no cuidado pastoral a colegialidade eclesial. Como gesto concreto de co-responsabilidade de toda a Igreja no Brasil em relação às Igrejas na Amazônia, a CNBB criou em 1972 o projeto “Igrejas-Irmãs” que tem favorecido o intercâmbio e a ajuda mútua entre dioceses e prelazias. Para articular melhor e favorecer mais ainda a solidariedade da Igreja de todo o Brasil para com a Igreja que está naquele chão, a CNBB criou em 2002 a Comissão Episcopal para a Amazônia (CEA).



Vários passos já foram dados:



· a divulgação em nível nacional do projeto com os programas a serem implementados;



· a criação de comissões regionais para favorecer o intercâmbio;



· o envio de missionárias e missionários, não só religiosos e religiosas mas também leigos e leigas para a região.



Estas iniciativas denotam que o processo se realiza como um grande MUTIRÃO pela e com a Amazônia, acolhendo o apelo do saudoso Papa Paulo VI: “Cristo aponta para a Amazônia”.



CF e Amazônia



A Campanha da Fraternidade, promovida pela Igreja e proposta para toda a sociedade brasileira, interpelou a própria Igreja chamando-a a assumir com maior responsabilidade sua presença na Amazônia. A CF/2007 convidou o Brasil inteiro a descobrir a Amazônia e conhecê-la melhor com a riqueza que ela representa para o Brasil e para o mundo. Interpelou ainda a sociedade para instaurar uma ética e uma espiritualidade que geram novas atitudes existenciais de convivência e relação harmoniosa com o universo, assumindo com toda a responsabilidade a missão de cuidar, zelar, defender e amar a criação como obra e dádiva divinas. Cuidar desse berço de vida exige de todos os brasileiros o compromisso de multiplicar instâncias de socialização e debates sobre a região que devem ser promovidos sobretudo pelas universidades, escolas, associações, sindicatos, ONGs e movimentos sociais. Importa pressionar, sobretudo, os políticos, deputados federais e senadores para que cumpram o disposto no art. 51 das disposições transitórias da Constituição Brasileira[1].



A CF sobre a Amazônia chamou a atenção de todo o Brasil. A previsão de alguns de que a campanha não iria decolar fora da própria Amazônia foi desmentida pela participação maciça nos eventos em todos os quadrantes do País. Almeja-se agora que o tema Amazônia continue em pauta e a campanha tenha sido apenas o ponto de partida para a conscientização e sensibilização da Igreja e da sociedade brasileira toda em relação a esta região maravilhosa que Deus criou como lar para tantos povos, hoje, infelizmente, tão ameaçada de destruição e morte, assim como os demais biomas brasileiros: a caatinga, o cerrado, o pantanal, a mata atlântica e o pampa.



Ao defendermos a Amazônia, estamos, sem dúvida, defendendo também os demais biomas do Brasil.



Amazônia brasileira e Pan-Amazônia



Os países que constituem a Amazônia Continental: Brasil, Bolívia, Colômbia, Peru, Equador, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa e Suriname enfrentam desafios semelhantes e sofrem as mesmas pressões internacionais. Urge assim discutir toda esta problemática no âmbito da Pan-Amazônia para catalisar forças e encontrar saídas comuns para os países de fronteira, visando o atendimento comum da população ao longo das fronteiras, especialmente os povos indígenas e população ribeirinha. A colaboração entre os países da Pan-Amazônia e iniciativas comuns para superar os problemas comuns chamaria a atenção do mundo para o conjunto da Amazônia, ameaçada pela cobiça internacional.



Amazônia e visão planetária



O relatório do Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), que envolveu 2.500 cientistas de 130 países, revelou dois dados estarrecedores:



a) o aquecimento global é irreversível e já estamos dentro dele; a Terra busca um novo equilíbrio;



b) o aquecimento é um fenômeno natural mas que após a revolução industrial foi enormemente acelerado pelas atividades humanas a ponto de a Terra não conseguir mais auto-regular-se. Prevêem-se inundações de cidades litorâneas, devastação da biodiversidade e milhões de pessoas correm risco de desaparecerem. Como não podemos parar a rota do aquecimento, podemos, pelo menos, desacelerá-la, mudando de paradigma.



O tema da Amazônia foi e continua sendo muito oportuno, pela importância que possui, no contexto brasileiro e mundial. Apesar de a CF-2007 ter assumido um tema regional, ele aponta para problemas que ultrapassam as fronteiras geográficas. Na aposta pela rearborização de todo o planeta, reduzindo a utilização dos bens naturais e reutilizando todos os recursos, entra a questão fundamental, que é a preservação da Amazônia.



A natureza é obra de Deus



O primeiro artigo que professamos no Símbolo apostólico é que Deus é Pai e o Criador do céu e da terra. Em sua Exortação pós-sinodal “Sacramentum Caritatis” o Papa Bento XVI relaciona o cuidado pela criação com a Eucaristia, insistindo no desígnio amoroso de Deus que, em Jesus Cristo, recapitulou todas as coisas[2]. Tudo, de fato, foi criado “em vista dele”[3].



“As condições ecológicas em que a criação subjaz em muitas partes do mundo suscitam preocupações, que encontram motivo de conforto na perspectiva da esperança cristã, pois esta compromete-nos a trabalhar responsavelmente na defesa da criação; de fato, na relação entre a Eucaristia e o universo, descobrimos a unidade do desígnio de Deus e somos levados a individuar a relação profunda da criação com a “ nova criação” que foi inaugurada na ressurreição de Cristo, novo Adão”[4].



A história do episcopado brasileiro registra denúncias feitas pelos bispos da Amazônia em relação às situações de ameaças à vida, entre as quais os fatores que provocam a destruição da natureza, os grandes projetos dos gasodutos e das hidrelétricas, o contínuo latifúndio, as queimadas, o desflorestamento, o avanço da pecuária e do agronegócio provocando a destruição das florestas tropicais, a ameaça aos recursos genéticos pela biopirataria, particularmente junto às comunidades tradicionais da região, as invasões de terras indígenas e a exploração econômica das riquezas naturais do solo e subsolo; o precário funcionamento e o descuido dos organismos oficiais de proteção aos Povos Indígenas e povos sem contato, o narcotráfico, a prostituição infantil e de adolescentes, o trabalho escravo, a violência no campo e na cidade e a conivência de autoridades a toda situação de injustiça e corrupção.



A Igreja na Amazônia historicamente tem assumido o compromisso na defesa da vida, da justiça e da paz para os povos dessa região. Ainda hoje, assistimos com apreensão e grande preocupação as ameaças feitas aos nossos líderes da Igreja da Amazônia, sobretudo ao Dom Erwin Krautler, Dom Antônio Possamai e Dom Geraldo Verdier, como também aos padres, religiosas e religiosos, leigas e leigos, com data marcada para morrer.



A vida de Ir. Dorothy Stang, sacrificada no dia 12 de fevereiro de 2005, não foi suficiente para dirimir a ganância daqueles que querem tudo e conseguem se sobrepor às leis e às autoridades.



O episcopado brasileiro registra o pedido às autoridades competentes para que atentem ao consórcio do crime formado por madeireiros, fazendeiros e sojeiros e outros, a fim de que ao povo amazônida e aos nossos líderes seja garantida a segurança, a tranqüilidade e a paz.



E o Mutirão deve continuar…



O Mutirão deve continuar. A Igreja está presente na Amazônia desde o século XVII e, cumprindo sua missão evangelizadora, sempre enfrentou grandes desafios e continua a fazê-lo até hoje:



§ grandes distâncias entre vilas, povoados, aldeias, cidades, estradas, vicinais, rios, igarapés, onde vive o povo. É uma “região-continente”, onde o acesso é difícil, lento ou deficiente, apesar de toda modernidade;



§ os meios de transporte e comunicação que a Igreja possui são limitados para uma atuação eficaz;



§ os quadros da Igreja (padres, religiosos/as, agentes de pastoral, catequistas) são insuficientes e há dificuldade para a renovação dos mesmos. É muito alto o custo de manutenção das casas de formação dos sacerdotes nos grandes centros (Belém, Manaus, Porto Velho, Rio Branco e Santarém). Também a formação de leigos e leigas é muito custosa;



§ os recursos financeiros são parcos, pela pobreza do povo católico, sobretudo nas regiões onde há maior necessidade de meios, pessoal, infra-estrutura e transporte;



§ em geral, as ajudas de fora – de dioceses ou paróquias, das instituições ou agências – só subsidiam alguns projetos ou iniciativas, porém com tempo limitado; acabando o recurso, acaba o projeto ou a missão. A carência de recursos humanos e financeiros dificulta grandemente a ação evangelizadora da Igreja na Amazônia.



A Amazônia é hoje cobiçada pelo mundo todo, e isto a torna vulnerável. A existência de incalculáveis riquezas naturais tem atraído para a região todo tipo de gente, desde os aventureiros de sempre, que querem enriquecer de forma ilegal, abusiva e desrespeitosa em curto tempo e depois vão embora, até famílias que sonham com melhores condições de vida e procuram um pedaço de chão onde podem plantar e colher para sobreviver. Os conflitos de terra estão na ordem do dia, a intensa migração continua a inchar cidades e povoados, a violência ceifa vidas e gera um clima de insegurança para a população, políticas públicas que propiciem a mínima infrastrutura para uma vida digna frequentemente não passam de promessas e custam a ser implementadas.



A ação evangelizadora e pastoral de nossa Igreja está sendo desafiada por grandes massas carentes de tudo, afastadas das comunidades eclesiais e paróquias e desprovidas de cidadania. O povo está ávido de evangelização, faminto do Pão Eucarístico, sedento da Palavra da Vida. A Igreja na Amazônia enfrenta muita dificuldade na sua vontade de saciar a fome e a sede de todos! Outros se aproveitam das lacunas e atraem as ovelhas para seus apriscos. Muitas vezes é a realidade social e pessoal fragmentada que leva as pessoas a procurarem novos grupos religiosos.



Mesmo assim a Igreja está marcando sua presença de modo original, criativo e inculturado. É grande a vitalidade da Igreja na Amazônia! Mas, respeitando a autonomia da caminhada eclesial na região, a Igreja na Amazônia precisa de uma colaboração sistemática, constante, e permanente e da solidariedade da Igreja toda no Brasil e no mundo para poder cumprir sua missão evangelizadora e ação pastoral e sustentar seus projetos de formação de seminaristas e de agentes de pastoral.



A partir do final da década de 70, muitas das antigas Prelazias foram elevadas à categoria de “diocese”, mas a Amazônia continua “Terra de Missão”! Somos hoje interpelados pela missão além fronteiras dentro do próprio país. Na era da globalização, nossa Igreja, mais do que nunca, deve contribuir para criar uma autêntica cultura globalizada da solidariedade“[5] Chegou a hora de uma grande ação solidária de toda a Igreja no Brasil e do mundo para a evangelização e a defesa da vida na Amazônia.



Itaici, 1 a 9 de maio de 2007



Cardeal Geraldo Majella Agnelo(Arcebispo de São Salvador da Bahia/Presidente da CNBB)



Dom Antônio Celso de Queirós(Bispo de Catanduva/Vice-Presidente da CNBB)



Dom Odilo Pedro Scherer(Arcebispo de São Paulo/Secretário-Geral da CNBB)





[1] Art. 51. Serão revistos pelo Congresso Nacional, através de Comissão mista, nos três anos a contar da data da promulgação da Constituição, todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares, realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987. § 1º – No tocante às vendas, a revisão será feita com base exclusivamente no critério de legalidade da operação. § 2º – No caso de concessões e doações, a revisão obedecerá aos critérios de legalidade e de conveniência do interesse público. § 3º – Nas hipóteses previstas nos parágrafos anteriores, comprovada a ilegalidade, ou havendo interesse público, as terras reverterão ao patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.



[2] Ef 1,10



[3] Col 1,16



[4] Sacramentum Caritatis,92



[5] Exortação Pos-sinodal Ecclesia in America, 55



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