Conheci Dom Franco Dalla Valle em 1978. Eu tinha apenas 17 anos. Era um momento difícil da minha vida. Deus tinha suscitado em mim o chamado, mas eu não sabia o que fazer. Não sabia sequer a quem me dirigir.
Numa noite de agosto daquele ano fui convidado com outros jovens do grupo juvenil da paróquia para participar de um show vocacional. Encontrei um grupo de seminaristas alegres que cantavam, rezavam e interagiam conosco. De repente apareceu um padre simpático, com um grande sorriso e nos fez um convite. Ele disse: Estes jovens seminaristas são aspirantes à vida salesiana. Se Deus quiser muitos deles serão religiosos e padres amanhã. Se algum jovem quiser conversar comigo eu estou numa sala aqui ao lado. Divirtam-se o show vai ser bom. Eu fiquei encantado com aquele padre. Em seguida fui atrás dele. Entrei na sala e ele me recebeu com muita simpatia. Conversamos e perguntei o que seria um aspirante salesiano? Em poucos minutos ele me falou de Dom Bosco e me convidou para ir até o aspirantado que ficava no Colégio Dom Bosco. Na segunda bem cedo eu fui. Lá estava ele lendo jornal. Cheguei tremulo e confuso, era a primeira vez que eu entrava numa casa salesiana. Sentia o coração arder de alegria e ao mesmo tempo sentia medo.
Conversamos muito e manifestei a ele o desejo de experimentar aquele estilo de vida. Aos poucos fomos nos conhecendo e comecei a ter com ele uma grande amizade. Entrei no aspirantado no ano seguinte e com ele convivi 3 anos. Pe. Franco era um salesiano de muita garra, esperança e verdadeiramente empreendedor. Ele acredita nas vocações da terra amazônica, mas queria salesianos fortes, audaciosos, criativos e ousados como ele. Nada de moleza. Tínhamos muito estudo, trabalhos de casa, partilha comum dos nossos bens, apostolado incansável no sábado e domingo, profunda vida de oração, abertura e acompanhamento espiritual com ele. Foi também padre Franco com outros formadores que fundou um curso de ensino médio para seminaristas. Ele era empenhado na nossa formação. Foi também com ele que comecei a ler os documentos do Concílio Vaticano 2o. Recordo até hoje a maneira firme e aberta com a qual ele nos falava do Concílio e das mudanças na Igreja. Era um mistagogo que sabia atrair e ao mesmo tempo nos deixava livres para crescer.
Depois ele se tornou inspetor. Durante o inspetorado dele eu passei a maior parte do tempo fora da inspetoria estudando. Quando retornei em 1995 fui para Ananindeua como diretor e meus contatos com eles se tornaram menos intensos. Contudo sempre o tive como exemplo de vida salesiana. Nos meses que antecederam a nomeação dele para bispo de Juína ele esteve comigo em Belém e me confidenciou que estava com muito receio de aceitar. Eu apenas escutei e fiquei calado. Sabia que a perda para a Isma seria grande. Afinal padre Franco acreditava nas vocações autóctones e poderia fazer ainda muito pela promoção das vocações mesmo depois de deixar o inspetorado.
Meu último encontro com ele foi este ano em Itaicí-São Paulo. Aproveitei a reunião dos Bispos e fui até lá para saudar Dom Luis e outros bispos amigos. O primeiro que encontrei foi Dom Franco. Ele estava alegre e cheio de planos para Juína. Conversamos um bom tempo e ele chegou até a me convidar para ir por lá para fazer um trabalho com os seminaristas que viviam com ele. Era um homem cheio de fé e desejo de mudanças. Um grande salesiano e grande bispo. Humilde, pobre e trabalhador como queria Dom Bosco.
Meu amigo e irmão Dom Franco Dalla Valle. Meu coração chora teu desaparecimento, mas sinto que no céu ganhamos mais um daqueles grandes filhos de Dom Bosco que souberam ser fiéis até o fim. Não posso ir a Juína, mas me uno ao teu povo na oração e na esperança. Intercede por nós querido irmão e mestre.