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Comunidade: um apelo a vida fraterna e partilha

Assistente Ivanildo em visita às comunidades rio-negrinas no Amazonas.

São Gabriel/AM – O mandato que Jesus deu aos primeiros discípulos de irem e testemunharem o evangelho continua sendo regra de vida para todo cristão, hoje e até o fim dos tempos (Mt, 28). As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (2011-2015), indica alguns passos que nos colocam em estado de permanente missão. Quero destacar nesta breve partilha alguns aspectos da vida em comunidade, forte marca dos povoados que visitei no Baixo, Médio e Alto Rio Negro ao longo deste ano, e que tem muito a nos ensinar.

Viver o encontro com Cristo implica formar vínculos com a comunidade. Nossos povos tradicionais sabem bem o valor e a força desta palavra. A comunidade é a casa que dá identidade ao indivíduo, que narra sua história e aponta os valores da tradição a serem seguidos. Isso significa dizer que cada membro é chamado por vocação a ser Animador dos irmãos assumindo tarefas voluntárias como capitão, catequista, administrador, animador; Profeta da esperança por meio do serviço de cura, de reza, benzimento; Semeador da boa noticia nas rodas de conversa, das altas risadas, das brincadeiras para fazer rir; Apóstolo da caridade e do amor no cuidado com os doentes e no respeito aos mais velhos.

Visitando as comunidades rio-negrinas no Amazonas.
Visitando as comunidades rio-negrinas no Amazonas.

Nos pequenos povoados, vilas, capelas que visitamos por motivos pastorais, sempre nos impressionou o senso de pertença pelo bem comum. Não faltam nos finais de semana os trabalhos comunitários na roça, a limpeza dos ambientes de lazer, as longas reuniões para programar atividades, resolver problemas e conflitos que por ventura existirem. Cada liderança esmera-se em fazer o melhor pela sua comunidade como quem cuida da própria roça e os irmãos reconhecem nele a figura de autoridade que orienta a vida de todos sendo colaboradores fiéis de suas iniciativas.

Basta soar o sinal, que pode ser um sino ou uma simples barra de ferro pendurada em algum galho próximo a maloca central, e toda comunidade se reúne. Não se percebe ansiedade nos semblantes do povo se a reunião passa da hora, nem se notam conversas paralelas fora do contexto das discussões. Os comunitários vez por vez apresentam suas dúvidas, agradecimentos e queixas, e como na praça grega a cada problema vão surgindo os conselhos oportunos.

Estes dias, visitando a comunidade S. Jorge no rio Curicuriari, me impressionou de modo todo particular a fala de um ancião. Na presença de um deputado federal e outras autoridades municipais e estaduais que visitavam aquela vila apresentando propostas de desenvolvimento, dizia: “sou o pai desta comunidade e se for para fazer uma empresa como essas que estão por ai, onde cada um cuida de si mesmo e não liga pro outros, eu não quero, sou contra”.

Ex-aluno de internato, este sábio homem Piratapuia, que atende por Libório, militante de longa data de associações e movimentos indígenas, percebe como o modelo capitalista de sociedade está mexendo com a vida do povo de sua região e estimulando o desejo pela posse, o ter, a primazia do meu, em detrimento do nosso: “o projeto é para a comunidade, queremos algo que beneficie todos”, completou.

Se eu tivesse que resumir em uma palavra o sentido, o valor, a força da vida comunitária do Rio Negro, eu diria Refeição. Desde a primeira vez que participei de uma refeição comunitária me impressionei com o sentido de solidariedade, preocupação com o outro, ordem, disciplina que a mesa estimula. Cada um trás sua panela, para que tudo seja de todos, ninguém se alvora a mesa com pressa, pois todos sabem que irão fartar-se. Os homens, as mulheres e as crianças esperam seu momento.

As comunidades tradicionais rio negrinas descobriram a muito tempo que sem a comunidade não há como bem viver, que a mesa farta, o Reino de Deus, a vida cristã é um dom para todos. A comunidade acolhe, forma, celebra, adverte e sustenta cada membro. Formar comunidade e viver em comunidade ultrapassa o sentido geográfico de espaço para dar lugar ao espírito de irmandade, de parentesco, nas frutas partilhadas, no xibé bebido na mesma cuia –“não precisa de prato não irmão, pega teu beiju e molha lá também”.

Onde existem sinais de intrigas, divisões, falta de perdão que deixa mágoa, a comunidade busca caminhos de conciliação pela conversa e por acordos de boa convivência – “nós aqui somos todos parentes, não podemos ficar brigados. O que aqui acontece aqui é resolvido”, me conta o canoeiro que nos trás lentamente pelas margens do rio na pequena rabeta comunitária. Enquanto olho as magníficas paisagens bate no coração o pesar de deixar estes lugares que mais se assemelham a recantos do paraíso, a terra sem males que todos sonhamos.

José Ivanildo de O. Melo, tirocinante sdb.

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