Quando li o convite para a missa de sétimo dia do nosso estimado Pe. Lourenço me deparei com uma das citações das Memórias Biográficas de Dom Bosco expressando que quando um salesiano sucumbe trabalhando pelas almas a congregação alcança uma grande vitória. Com certeza, para aqueles que tiveram a oportunidade de conviver com o Pe. Lourenço, bem sabem que esse texto aplicado a sua vida não é um mero chavão.
De fato, Pe. Lourenço foi um salesiano que viveu admiravelmente esse traço da espiritualidade salesiana: o trabalho. Pelas suas próprias origens piemontesas soube, assim como Dom Bosco, cultivar desde cedo essa virtude, não por acaso a obra que fundaria em Belém teria o nome de Escola Salesiana do Trabalho. Um trabalho que não era centrado sobre si mesmo, mas que sempre foi marcado por aquele espírito evangélico do eu estou no meio de vós como aquele que serve e é com esse sentimento que pôs a termo sua obra como salesiano em prol da juventude mais necessitada.
Tal trabalho não tinha para o Pe. Lourenço somente uma perspectiva empreendedora ou de promoção social, mas era, sobretudo, marcado por um forte apelo de zelo pelas almas, era como se fosse movido por um grande senso de responsabilidade diante do dom da vocação ao qual Deus lhe chamou. Vocação essa que ele comunicava com grande paixão e seriedade através do seu testemunho pessoal de vida e de suas palavras. Frequentemente dizia que se nascesse cem vezes, cem vezes se faria salesiano, tal a certeza em relação ao caminho que o Senhor lhe tinha reservado. Como missionário mostrou esse total despojamento de si, assumindo com coragem e generosidade a missão que o Senhor lhe confiou nas terras da Amazônia.
Na última vez que o vi na Casa Inspetorial em Manaus, já bastante debilitado pela sua doença, cheguei a pensar que aquela figura com o olhar distante e cansado já não representava o homem cheio de um ardor infatigável e de um otimismo vibrante que ficou impressa na minha memória. Foi quando ao partilhar com ele minha experiência de férias em uma obra salesiana, ele esboçou um sorriso e com aquele olhar que rasgava a alma me disse, balbuciando e com um suave suspiro, o quanto gostaria de ser missionário no Rio Negro, afinal tinha vindo para a Amazônia na expectativa de trabalhar entre as comunidades indígenas daquela região. Naquele momento percebi que seu espírito continuava inquebrantável e que apenas o seu corpo já não podia reagir a sua vontade indomável motivada por aquelas palavras manifestas por Jesus: o zelo pela tua casa me consome.
O que me chamou a atenção nessas suas palavras foi o fato de não significarem uma espécie de arrependimento por algo que gostaria de ter realizado, mas sim a perspectiva de um projeto de vida para um futuro próximo, como se vivesse a expectativa de uma nova obediência, como se o Senhor estivesse lhe chamando para novos campos a serem evangelizados. É nessa expectativa que imagino que o Pe. Lourenço tenha partido para a casa do Pai. Certamente agora, junto ao seu Deus de amor, ele está a cuidar daquele pedacinho do céu de que tanto almejava: o jardim salesiano. De lá acompanha a missão salesiana na Amazônia e acredito que esteja realizando dessa forma o seu sonho missionário entre os povos indígenas do Rio Negro, por isso gosto de pensar que Pe. Lourenço não está descansando na glória do Pai como se costuma dizer, mas para ser fiel ao que ele representou em vida penso que esteja trabalhando na glória do Pai.
Márcio Alexandre G. Fernandes
salesiano – noviço do Pe.Lourenço em 1999)