1. DA MIHI ANIMAS
I. O que é espiritualidade?
Em nossos dias muito se fala de espiritualidade. Inclusive as empresas estão preocupadas com o assunto. Teólogos e terapeutas espirituais são chamados para assessorar estas empresas e seus executivos. O que elas buscam? No meio de tanta produtividade e crescimento econômico, o ser humano sucumbe! Muitos percebem que a conquista de bens materiais não corresponde às necessidades espirituais. No fundo as pessoas estão vazias. Há um grito por necessidades não-materiais que possa preencher o vazio de algo fundante, nós chamamos de Deus, eles dão outros nomes: cosmo, energia. O momento dramático no qual vivemos hoje com tantos desgastes humanos e pouca humanidade, assinalam uma nova re-definição do ser humano.
Fato é que a humanidade está grávida e não sabe de que! Ela geme de dores, mas tem medo do que possa nascer. A espiritualidade entra neste processo de busca de significado. Três exemplos podem nos ajudar a compreender, não por conceitos, mas pela experiência do cotidiano, o sentido da espiritualidade.
1a. Transformação interior: No livro “Uma Ética para o Novo Milênio” o grande Dalai-Lama narra que uma vez perguntaram a ele o que é a espiritualidade. A resposta cabal do monge foi: A espiritualidade é aquilo que produz no ser humano uma mudança interior. Isto para mim é fundamental na prática dos retiros espirituais. Se um retiro não chega a mudar minha forma de relacionamento, não muda radicalmente meus centros de interesses, não produz frutos novos no projeto pessoal de vida, não me leva a interagir com meus irmãos no grande projeto missionário da comunidade; então, estou vazio de espírito, ou seja, de espiritualidade. Não basta pensar que a prática da religião seja suficiente porque espiritualidade e religião são diferentes: a primeira é um processo dinâmico que move minha interioridade e entranhas porque ali há espaço para a ação do Espírito de Deus; a segunda pode ser um grande edifício de normas e valores, que subjetivamente sigo ou não, com seus ritos, gestos, símbolos, dogmas. Ela pode me levar a uma rica espiritualidade desde que seja capaz de mover minhas entranhas transformando-me até chegar a me identificar com o projeto do Reino em Cristo Jesus. É um encontro consigo mesmo para poder encontrar a Deus;
2a. Jesus e seu Reino: A pessoa de Jesus, que nestes dias teremos sempre diante dos olhos, nos orienta a repensar nosso projeto de ser humano. Ele mesmo é a presença salvífica do Reino anunciado: “meu Reino não é deste mundo”. Poderíamos também dizer: não é deste mundo, mas é luz neste mundo! Jesus viveu uma espiritualidade mística e política. Do ponto de vista místico ele foi o FILHO do Pai (Mt 11,25s; Lc 11,2s). Sua filiação é comprovada em todos os textos do Novo Testamento. A relação com o ABBÁ é tão intensa que os discípulos se encantam e pedem: ensina-nos a rezar! Esta relação de Jesus com o Pai se constitui na sua relação com os discípulos: Vocês são meus amigos! Do ponto de vista da espiritualidade política ele é o anunciador do Reino da compaixão, da justiça, da misericórdia, do perdão, da festa do filho que retorna (Mt 20,29ss; Lc 7,11s; Jo 11,38). Um Reino que rompe barreiras e preconceitos; que o leva a sentar-se à mesa com as prostitutas, mendigos, pecadores e beberrões, e desde ali ser o Reino para eles. A comunidade antiga entendeu isto, mas os tempos nos fizeram mudar de perspectiva. Jesus foi movido interiormente pela compaixão; por isso não se omitiu de dar a vida (Jo 10,10). Num texto de grande profundidade esta proposta de vida nova é apresentada a um fariseu que procura Jesus no meio da madrugada, é a busca do ressuscitado, na escuridão, na cegueira para a luz; para este Nicodemos, mestre da Lei, Jesus propõe NASCER DA AGUA E DO ESPIRITO (Jo 3,5). Nascer da água nos lembra a purificação, deixar para trás o “Egito” da escravidão, as obras da carne, o homem da carne; Nascer do Espírito é a nova criação vinda do sopro de vida. O homem novo transfigurado.
continua…..